sexta-feira, 26 de outubro de 2012

A irresponsabilidade do Decano

 

Autor: Luis Nassif

Há duas maneiras dos Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) se manifestarem: uma, através dos autos; outras, através de manifestações extra-autos.

No primeiro caso, preserva-se a liturgia do cargo e até se pode disfarçar preferências, preconceitos e ideologia através das escolhas doutrinárias. A profusão de citações oculta ao leigo a enorme dose de subjetividade que permeia julgamentos.

Quando os magistrados enveredam pelo caminho da exposição pública e se permitem manifestar preferências políticas, o jogo muda. A toga vira ornamento vestindo o ego de uma celebridade. E o magistrado se expõe ao olhar público, como qualquer celebridade.

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Sem o manto solene da toga, há muito a se reparar na personalidade de cada um: na falta absoluta de civilidade de Joaquim Barbosa, nos episódios controvertidos de Gilmar Mendes (que protagonizou uma possível fraude, com o senador cassado Demóstenes Torres, no episódio do "grampo sem áudio"), nas decisões sempre polêmicas de Marco Aurélio Mello, na submissão total de Ayres Britto aos clamores da mídia.

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Mas nada se equipara à irresponsabilidade institucional do Ministro Celso de Mello, decano do STF.

O Ministro cumpriu carreira típica de servidor público qualificado. Primeiro, foi Procurador do Ministério Público Estadual (MPE) de São Paulo. Com reputação consolidada, foi guindado ao cargo influente de principal assessor jurídico do controvertidíssimo Consultor Geral da República do governo Sarney,  Saulo Ramos.

Ainda estão por serem reveladas as peripécias de Saulo à frente da consultoria e, depois, como Ministro da Justiça do governo Sarney. Foram muitas, desde a mudança do decreto do Plano Cruzado, visando dar sobrevida à indústria da liquidação extrajudicial, até o parecer conferindo direito aos investidores de títulos da dívida pública de receberem a correção monetária integral de um ano de congelamento, mesmo que tivessem adquirido o título na véspera do descongelamento.

Celso era o grande filtro técnico, o especialista capaz de dar vestimenta técnica às teses mais esdrúxulas de Saulo.

A Saulo, Celso serviu. E, como recompensa, ganhou a indicação para Ministro do STF.

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Há toda uma hierarquia no serviço público na qual poderosos de hoje dependeram de favores dos antigos poderosos de ontem.

Até aí tudo normal. Não consta, em sua longa carreira, que o decano Celso de Mello tenha desmerecido a instituição para o qual foi indicado, mesmo levando-se em conta a qualidade dos seus padrinhos.

A grande questão é a maneira como ele, do alto da posição de decano do STF, está conduzindo suas declarações políticas. É de uma irresponsabilidade institucional mais adequada a um jovem carbonário do que a um decano.

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Não se discutem as penas. Isso é prerrogativa do Magistrado. O que se discutem são as manifestações políticas inadmissíveis para quem representa o Supremo e a subordinação à segunda pior forma de pressão: o clamor da mídia (a primeira é a pressão do Estado).

Há uma grande chaga na política brasileira: as formas de cooptação de partidos políticos. E duas maneiras de combatê-la: entendendo-a como um problema sistêmico ou focando em apenas um partido.

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Ao investir contra os "mensaleiros" com um rigor inédito, o STF desperta duas leituras: a benéfica, é o da necessidade da punição exemplar do episódio para extirpar sua prática da vida política nacional; a segunda, a de que seu rigor se limitará a esse julgamento, não aos próximos. Contra a imagem de isenção da corte tem-se a maneira como indícios foram transformados em provas. E tem-se o modo como o STF mudou a jurisprudência até então em vigor.

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Há duas linhas de análise dos crimes das chamadas organizações criminosas. Uma - a "garantista" - exige a apresentação de provas objetivas para a condenação. Outra sustenta que, devido à complexidade das organizações, os julgamento podem se basear apenas em evidências. Até então, o STF adotava a primeira linha doutrinária, que beneficiava criminosos de “colarinho branco”. A partir do "mensalão", passou a adotar a segunda.

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Não será fácil conquistar a aura de poder severo com todos os crimes. Na mesma semana do mensalão, por exemplo, o Ministro Marco Aurélio Mello concedeu habeas corpus a um vereador carioca suspeito de chefia uma gangue de milicianos. No episódio Satiagraha, o STF, quase por unanimidade, acolheu a agressividade ímpar do Ministro Gilmar Mendes e concedeu liminar a um banqueiro cujos lugares-tenentes foram flagrados tentando subornar um Policial Federal.

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O Ministro Marco Aurélio concedeu um habeas corpus a Salvatore Cacciola que, nos poucos dias antes de ser derrubado, permitiu a fuga do ex-banqueiro. No momento, a Operação Satiagraha está parada no STJ, apesar dos esforços do Ministério Público Federal. No caso do chamado “mensalão mineiro”, segundo o próprio Joaquim Barbosa, foram os demais Ministros que aceitaram o desmembramento da ação, ao contrário do “mensalão do PT”.

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Só no próximo julgamento se saberá se o STF é isento ou discricionário. No entanto, a discricionariedade de Celso de Mello se manifesta antecipada e gratuitamente no campo das manifestações políticas, com um desapreço pelo sistema Republicano de causar inveja aos juízes da ditadura. Não se limitou a condenar o cooptação dos partidos mediante pagamento. Condenou como ditatorial o próprio instituto das coligações partidárias, peça central de governabilidade no país.

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Sabendo ser generalizada a prática de cooptação, os financiamentos obscuros de campanha, em vez de uma crítica geral à prática – até como sinal de que outras infrações receberão o mesmo tratamento - chegou ao cúmulo de comparar um partido político ao PCC.  O que pretende com isso? Criar uma situação de esgarçamento político com o Executivo? Colocar o STF a serviço de um partido? Dar razão aos críticos que duvidam da isenção do tribunal?

 

2 comentários:

Tadeu disse...


A fúria é somente com o PT.

O STF deixando de lado a já conhecida "Teoria do Domínio dos Fatos, decidiu não processar Garotinho, numa votação acontecida na semana passada.

Por consequência, o STF decidiu remeter o processo à primeira instância, às vésperas de sua prescrição, passados os oito anos da apreensão dos R$ 318 mil, no comitê do candidato de Garotinho a prefeito de Campos, em 2004, Geraldo Pudim.

Segundo a decisão do STF, Garotinho nenhuma relação teve com os R$ 318 mil apreendidos no comitê do candidato do partido do qual ele era a liderança maior. O STF entendeu que o Garotinho não teria nenhuma ingerência naquele processo.

É oportuno relembrar que a ministra-relatora Rosa Weber argumentou que uma lista de 35 mil eleitores, com detalhes como dos números de documentos, num município de 460 mil habitantes, quase 10% incluindo idosos e crianças, não poderia ser de trabalhadores de campanha e sim de captação irregular de votos.

A ministra relatora Rosa Weber disse também que o fato do ex-governador estar no local da apreensão dos R$ 318 mil, além de ter dito de forma publica e por diversas vezes, que estava saindo do governo de sua esposa para se dedicar à campanha de Geraldo Pudim a prefeito de Campos, eram mais que indícios, na verdade provas, de sua participação no esquema.

Vale a pena você conhecer os detalhes das denúncias sobre a forma de "compra de votos" que foi relatada no STF. Para isto o blog disponibiliza abaixo os detalhes do julgamento e da decisão acontecida, no dia 17 de outubro de 2012. O vídeos do julgamento do STF estão divididos em dois blocos e estão reproduzidos abaixo.

O blog insiste que você morador da região precisa assistir aquele julgamento. Eu já disse aqui neste espaço que seria interessante que alguém disponibilizasse a lista dos 35 mil eleitores elencados como beneficiários dos esquemas eleitorais na eleição de 2004 em Campos.

Os moradores de qualquer parte do país, não tem a obrigação de saber, menos ainda relembrar um fato de oito anos atrás, menos, os moradores de Campos, que sabem, em detalhes o que ali ocorreu e que foi considerado pelo egrégio STF, insuspeito.

Depois que o STF julgou você também pode fazer o seu julgamento, mesmo, isto, nada altere lei dos homens. Fazendo isto enfrentamos aquilo que o geógrafo Milton Santos chamou de "violência da informação".

O blog tem sempre o dever e cumpre isto como obrigação de fazer você pensar, refletir, mesmo, que, com todo o direito democrático, ao final você venha concluir e discordar deste blogueiro. Assim, lhe pergunto: há coerência nas decisões do STF? Há coerência nesta nova chamada “Teoria do Domínio dos Fatos”?

Fernando Cardoso no STF! disse...

E agora Barbosa?
José Dirceu não pretende declarar-se “prisioneiro político de um julgamento de exceção”, como um jornaleco noticiou.

O que ele e seu advogado ainda não decidiram são os termos dos embargos infringentes que apesentarão ao Supremo.

Uma coisa porém é certa, caso o tribunal insista na farsa de “compra de votos”, o ex-ministro exigirá que os ministros indicados pelo presidente Lula, quando ele era chefe da Casa-Civil, renunciem ao mandato no STF, visto que as aprovações do Senado às suas próprias nomeações, segundo eles mesmo afirmaram peremptoriamente, sofrem de vício de origem, pois foram “compradas”.

Tem mais: não será seu advogado que fará isto. Será ele mesmo, Dirceu, como advogado de outro réu.

Já imaginaram o IBOPE desta sessão na TV Justiça?

O que farão os ministros cuja sabatina e aprovação pelo Senado, antes de serem nomeados, teria sido “comprada” ?
Será que suas suspeitas, sem prova, são seletivas e valem apenas para Dirceu e Genoíno não valem para eles mesmos, quando seu interesse pessoal está em jogo?

Será que desta vez, nossos ministros do STF ficarão caladinhos, recebendo seus polpudos salários, mordomias e ainda os pagamentos por fora que Gilmar Mendes, operador do “mensalão tucano” no STF, dá a eles a título de “pagamento por serviços prestados” ao seu Instituto de Brasiliense de Direito Publico, num flagrante desrespeito ao princípio da impessoalidade e da autonomia do STF de particulares?

E o Joaquim Barbosa, renunciará ao cargo?…

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