quinta-feira, 7 de junho de 2007

A mídia faz política
Edição 447 - 06/06/2007

As denúncias contra Renan Calheiros, mescladas impropriamente com a Operação Navalha, embora mereçam investigação, só valem para manter o governo sob pressão. Destaques também para a não renovação da concessão da RCTV na Venezuela, o apoio dos meios de comunicação franceses à Sarkozy e a imprensa americana pautada pelo governo Bush. E uma entrevista exclusiva com o ministro Mantega


por Mino Carta

O denuncismo no Brasil é de mão só. Visa-se Lula há décadas. Os jornalistas e seus donos não percebem, porém, que foram os grandes derrotados no pleito de 2006
Será a mídia a guardiã da ética, anjo protetor do decoro, sentinela do Estado de Direito? Justificam-se vertiginosas dúvidas. No Brasil e no mundo, são poucos os órgãos midiáticos que ainda praticam o jornalismo à sombra dos velhos, insubstituíveis princípios: fidelidade canina à verdade factual, exercício desabrido do espírito crítico, fiscalização diuturna do poder onde quer que se manifeste.
A independência está em xeque sempre que os interesses do patrão e dos seus negócios, do poder político e econômico, obstam o cumprimento dessas regras. Ou, simplesmente, quando são atiradas à lata do lixo para atender às conveniências de uns e outros, ou de todos.

Há décadas avança o processo de afastamento do jornalismo do papel inicial de serviço público. No Brasil, a rota é diversa daquela percorrida em outros países (leia a reportagem de capa), em decorrência do nosso atraso, a nos manter em um tempo especial, suspenso, mas não equilibrado, entre Idade Média e contemporaneidade. São coetâneos, aqui, diretores de redação por direito divino e computadores da última geração.

Tomemos o exemplo da cobertura da mídia a respeito da Operação Navalha e do caso Renan Calheiros. Até parecerá, a olhos e ouvidos desavisados, que se trata de um balaio único de escândalos. São, porém, distintos. É bom que venham à tona, mas cada um deveria ser colocado no devido lugar. A denúncia, além de oportuna, é necessária, e agora é só esperar pela condenação dos culpados. No entanto, jornais, revistas e emissoras misturam tudo.

Chafurdam (oportuno, também, é evocar esse verbo) no denuncismo, no encalço da crise. Qualquer uma serve, desde que ponha em dificuldade o governo, ou tente pôr.
É um clássico da história do jornalismo nativo. A fúria midiática é, e foi, de mão só. Evitemos recuar demais, lembremos o mar de lama em que chafurdaram (voltei ao verbo) Carlos Lacerda e sua UDN, até levar Getulio Vargas ao suicídio. E recordemos as campanhas anti-Juscelino, ou pró-Jânio Quadros, o fio desencapado da hora agarrado para impedir a eleição do marechal Lott.

Havia um ranço udenista até então. Mas quando se tratou, primeiro, de torpedear a legítima posse de João Goulart depois da renúncia de Jânio, e menos de três anos depois de derrubá-lo, a mídia estabeleceu o consenso total, sonho dourado da nossa oligarquia. E convocou os gendarmes para o golpe de 1964, a terceira, imensa tragédia brasileira, depois da colonização predatória e da escravidão.
A mídia não hesitou na agressão ao Estado de Direito, e omitiu-se, e mentiu, 21 anos a fio, até o momento em que a ditadura fardada se esvaiu em seus próprios erros e contradições. A adesão à campanha das Diretas Já foi lenta e parcial, e ao cabo não houve jeito de escapar à rendição à vontade popular. Poucos, porém, enxergaram nas indiretas uma derrota.

Em 1989, o fio desencapado foi Fernando Collor, valia tudo contra o Sapo Barbudo. O novo presidente passou a exigir pedágios cada vez mais elevados, até a célebre CPI sem provas da corrupção denunciada pelo irmão. Não passaria de um chega-para-lá, não fosse o motorista Eriberto, que apresentou a demonstração inegável da ligação entre a Casa da Dinda e PC Farias. E então desencadeou-se a pantomima das manifestações pró-impeachment, orquestrada pela inefável Globo.

Depois, o apoio irrestrito e enamorado a Fernando Henrique Cardoso. Roberto Marinho acreditou cegamente na sua colunista Miriam Leitão, segundo quem a estabilidade, bandeira da campanha da reeleição, era donzela inviolável. Deu-se, contudo, o maior engodo da história eleitoral brasileira, 12 dias depois de empossado FHC desvalorizou o rublo, perdão, o real.

A mídia condescendeu, assim como ocorreu quando das privatizações, de, no mínimo, duvidosa feitura. Quem sabe valesse perguntar o que pensam a respeito alguns dos mais atilados articuladores fernandistas. Digamos, o Mendonção, bem-posto cidadão escorado por filhos criativos. Ou André Lara Resende, que hoje vive em uma quinta em Portugal e monta em Londres na sela de cavalos conduzidos até lá de avião. Houve tempo em que os coronéis nativos levavam vacas para Paris, a fim de garantir leite matinal.

E a mídia? Impassível. Só emerge da expressão de Buster Keaton quando se trata de fazer campanha a favor de José Serra ou de Geraldo Alckmin. Contra Lula, ainda e sempre o Sapo Barbudo. E por aí o bombardeia, sem pausa ou refresco, por um ano e meio para verificar, finalmente, que as bombas caíram n’água.

Há quem diga que denunciar escândalos pode ser fenômeno promissor. Pensamento similar àquele de quem supõe que pena de morte reduz o número de assassínios. A mídia brasileira até hoje não traiu a si mesma e às suas tradições. Se há algo positivo neste quadro é a vitória exuberante de Lula no ano passado contra a mídia, antes de ser contra Alckmin.

Eles próprios, os jornalistas e seus donos, deveriam constatar que não chegam lá, ao contrário do ocorrido no século passado. Às vezes me pergunto se a mídia cogitaria substituir os partidos, em plena falência, ou se acredita que a substituição já se deu. Recomenda-se não esquecer que partidos se consolidam no voto. A julgar por 2006, convém à mídia repensar a si mesma.

Um comentário:

José Carlos Lima disse...

Estas imagens são da Argentina. E poderiam ser da Bolívia, Venezuela.

Como se parecem conosco! Realmente os ventos tucano-DEMentes do neoliberalismo fizeram um estrago danado na Argentina, outrora tida como uma espécie de Europa na América do Sul, face ao alto padrão econômico e cultural daquele povo.

Estas imagens, ainda mais com o canto de Virgínia Rodrigues, é bastante comovente.

E falando em mídia, você viu o quanto Serra é um santo de pés de barro. Pesquisas indicam que uma simples greve estudantil fez um estrago na santa imagem do queridinho da mídia.

Lembra-se do outro fruto da mídia, o Collor?

Nestas horas, torço para que Lula se candidate de novo. Este sim, é forte.

Já reviraram o home de tudo quanto é jeito, prenderam até os irmãos dele e nada de Lula ter cometido qualquer crime.

Este sim, é lider!

Veja este vídeo com imagnes da Argentina e voz da magistral Virgínia Rodrigues

http://www.youtube.com/watch?v=Fw6L-xjRwMw

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