quarta-feira, 17 de agosto de 2005

Assim caminha a humanidade

O acordo fechado entre os partidos para evitar o impeachment de Lula nada mais é do que a confissão de que, em algum momento de suas existências, se serviram das mesmas práticas que agora condenam com veemência. Exceto umas poucas e menos expressivas, todas as grandes legendas têm alguém "cassável" por ter recebido dinheiro de caixa dois para financiar campanha eleitoral. Não deveriam se chocar quando, naquela entrevista concedida em Paris, o presidente disse que recursos não contabilizados - para usar a "delubiana" expressão - são uma prática comum no Brasil. Ainda que o presidente tivesse sido imprudente, estava sendo absolutamente verdadeiro.

A leitura que se faz disto é simples: a Câmara perdeu completamente a envergadura moral para pôr para fora um presidente da República. Contra o qual, até agora, realmente nada surgiu, mas e se surgir? O Congresso hoje precisa purgar aqueles que considera maus parlamentares para, só depois, fazer julgamento parecido em relação a Lula. Enquanto tais quistos continuarem fazendo parte do Legislativo, terá o Palácio do Planalto um excelente argumento em sua defesa. Afinal, como disse Jesus Cristo, quem jamais pecou que atire a primeira pedra.

E os partidos não estão em condições disto. É esta, aliás, a grande diferença entre Lula e Collor, apesar de quererem comparar um a outro: hoje, dois Poderes da República estão contaminados por práticas ilegais; naquela época, apenas um - o Executivo. Além do mais, é bom que se diga que o ex-presidente tinha contra si o pagamento de despesas pessoais pelo Esquema PC. O atual, apesar da boataria dos cartões de crédito, parece que não.

Concorrem também para que não se queira chegar ao impedimento de Lula a possibilidade de o vice José Alencar ser removido junto do poder. O terceiro na linha de sucessão seria o presidente da Câmara, deputado Severino Cavalcanti (PP-PE), algo que, definitivamente, não agrada ninguém. Sobretudo por pertencer ele a um partido no qual pelo menos três deputados estão cotados para perder o mandato - José Janene, Pedro Correa e Pedro Henry. Sem contar o fato de que não há muita segurança sobre se Severino passará por todo este processo incólume.

Assim, as variáveis políticas começam a se mexer. Não no sentido de deixar a sociedade sem respostas a tanta indignação, mas para, ao menos num primeiro momento, se rearrumarem moralmente amputando membros. E é preciso perguntar agora enquanto a insatisfação está fresca: evoluirão além disto? Do contrário, já se pode esperar nova crise, em futuro não tão distante assim, envolvendo os partidos.

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