domingo, 8 de janeiro de 2006

Números desafiam a lógica

Parlamentares apelam para a família e aproveitam o período de festas
para fazer campanha, oficialmente proibida pelo Tribunal Superior Eleitoral



Enquanto uma campanha mediana a deputado federal custa, aproximadamente, R$ 2,201 milhões, as despesas declaradas pelos parlamentares eleitos em 2002 ao Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) variam de R$ 3.999,94 a R$ 552.716,64. Na disputa pela Assembléia Legislativa, em que uma campanha mediana exige cerca de R$ 1,540 milhão – 30% a menos do que a de deputado federal - os gastos anunciados na prestação de contas à Justiça pelos eleitos oscilaram de R$ 2.512,84 a R$ 454.948,00.


Peças de ficção, as prestações de contas viraram instrumentos meramente formais, para cumprir a legislação, num contexto em que impera o caixa 2 ou os “gastos não -contabilizados” de campanha, eufemismo que ganhou força à reboque da crise política que se abateu sobre o Congresso Nacional. Do PT ao PSDB, passando pelo PFL, PP, PL, PMDB, PTB, PDT e legendas menores, nenhum dos partidos pode atirar a primeira pedra. Sem qualquer mudança significativa nas regras eleitorais deste ano, como financiamento público de campanha, em um ponto políticos, empresários e juristas estão de acordo: a prática será mantida. “Acabar com o caixa 2 é realmente uma tarefa muito difícil, porque temos homens de todos os tipos”, comenta o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Carlos Mário Velloso. “A natureza humana é variável.


Esse desonesto vai sempre querer inventar meios de ludibriar, passar alguém para trás”, diz. “Geralmente é o candidato quem pede para não aparecer, para não ficar marcado. Por isso o lobby deveria ser institucionalizado no Brasil”, afirma Petrônio Machado Zica, da Delp Engenharia Mecânica, vice-presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg). Para ele, sem financiamento de campanha dificilmente o caixa 2 acabará. ANONIMATO De um lado, estão empresários que freqüentemente financiam candidatos adversários e não têm interesse em tornar públicas as doações de campanha.


Elas não raro ocorrem por meio do pagamento de serviços contratados pelas campanhas. Do outro lado, há candidatos que nem sempre desejam anunciar quem são os seus apoiadores, seja porque acham que não seriam bem interpretados pelas bases eleitorais, seja porque temem ser acusados de lobistas em sua atuação parlamentar. Para muitos deputados, a campanha mais agressiva à reeleição começou em dezembro, com a produção e veiculação de outdoors com mensagens de fim de ano.


Para muitos, a lógica por trás da estratégia é simplória: “Divulgo votos de boas-festas agora. Um mês antes do pleito, programo nova campanha, dessa vez, pedindo o voto. O eleitor raciocina: ele me desejou bom ano novo, não é só agora que se lembra de mim”. Na Região Metropolitana de Belo Horizonte, cada ponto de outdoor, por 14 dias, custa R$ 520,00. Já a criação e produção do material é estimada em R$ 83 por cartaz. Mensagens de fim de ano em 100 pontos no estado não saem por menos de R$ 52 mil. À campanha de outdoors de boas festas, segue-se no início do ano, entre fevereiro e março, o envio de um brinde de utilidade ao eleitor. “Quanto mais útil, mais ele guardará o material de campanha. Toda vez que usá-lo, verá a foto e o nome”, gosta de salientar um deputado.


Os brindes podem ser calendários, marcadores de livros ou, para parlamentares com base em igrejas, marcadores de Bíblia. Entre o brinde de fevereiro e junho, tempo das convenções partidárias, os parlamentares correm atrás de financiamento. “A procura começa a partir de fevereiro ou março”, sustenta Lincoln Gonçalves, que preside o Conselho de Política Econômica e Industrial da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg). Campanha agressiva após as convenções Depois das convenções partidárias, os deputados, que até então trabalhavam discretamente, põem os blocos ostensivamente nas ruas. Geralmente, enviam em mala direta carta de intenções.


A elas se seguem santinhos e novos brindes, sempre utilitários: chaveiros, lixas de unha, canetas de qualidade (porque se escreverem mal depõem contra o candidato), porta-títulos, bonés e camisetas. Essas não dispensam o truque. Em menor proporção é encomendado para o pessoal de campanha e colaboradores mais próximos material de primeira qualidade. Quando a equipe chega às localidades para pedir o voto, impressionam e ouvem solicitações de camisa. Entregam as de pior qualidade. No último mês de campanha concentram-se as despesas mais intensas, além de outdoors e minidoors, e muitos brindes.


No dia do pleito, mais gastos: são contratados em média 10 mil cabos eleitorais para distribuírem 2 milhões de marmitas (santinhos com o número do candidato). Ganham em média R$ 25 o dia (incluído o lanche). A estratégia de parlamentares considera que ainda que os “boqueiros” não consigam convencer estranhos, se os próprios votarem e trouxerem mais 2 familiares cada, serão 30 mil votos a mais, o suficiente para fazer a diferença.
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