terça-feira, 7 de novembro de 2006

"Apagão" uma ova


Fabio Grecchi

Quis-se qualificar o caos dos aeroportos, semana passada, como um "apagão aéreo". Antes mesmo de um exagero, uma classificação de má-fé. Foi preciso o afastamento de uma turma inteira de operadores de vôo (nada menos que 18 pessoas), por conta da tragédia envolvendo o jato da Gol, para que se tivesse noção do nível de estresse a que estão expostos aqueles que cuidam da segurança aérea.

De apagão, francamente, não teve coisa alguma. A operação padrão que fizeram, com cada técnico cuidando de somente 14 aeronaves, foi semelhante àquela que, de vez em quando, a Polícia Federal faz na Ponte da Amizade, em Foz do Iguaçu. A diferença é que lá pegam sacoleiros e trambiqueiros de menor cacife. Nos aeroportos transita gente de algum poder aquisitivo, com alguma importância e, sobretudo, muita pressa. Seja para fazer turismo ou para cuidar da vida.

Temeu-se pela volta do feriadão. Repetiria-se o caos? Não. O esquema montado emergencialmente funcionou minimamente bem. Mas a questão está longe de ser resolvida. Somente com esta crise é que se soube que o operador de vôo é um profissional de altíssima qualificação e mal pago. Do curso à atuação num dos controles de tráfego aéreo do País, no mínimo seis anos, tempo de um mestrado, um doutorado e um pós-doutorado. O governo abriu concurso para a contratação de 64 desses técnicos, que estarão aptos a trabalhar somente por volta de 2012.

Agora que a poeira assentou, ninguém mais se lembrará que o operador estará lidando com uma capacidade de controlar vôos acima do que permitem as normas de segurança. O que importa ao passageiro, este que não pensou duas vezes em classificar o caso como "apagão", é sair e chegar razoavelmente na hora.

O setor do turismo, que se diz o mais atingido por questões como estas, voltará a se preocupar somente com a venda de pacotes e os receptivos. O mais é problema da Aeronáutica. Se o controlador continuará tendo formação militar isto não é um problema que diz respeito a quem vive de encher hotéis e programar passeios.

Este raciocínio largou os operadores mais uma vez à própria sorte. "Apagão" aconteceu no governo Fernando Henrique Cardoso, quando a falta de investimentos no setor de energia impôs ao brasileiro pouco mais de um ano de uma agrura cuja responsabilidade o Palácio do Planalto estava há tempos avisado. Jogaram, simplesmente, com a sociedade e a economia da Nação. Com os controladores, não: ninguém tinha a menor idéia daquilo que de fato ocorria. A prova de que a questão nada teve a ver com política ou desinteresse do governo é que não foi explorada durante a corrida presidencial, que se encerrou domingo retrasado. O governo Lula tratou muita coisa com desídia, mas este não foi o caso.

Dificilmente uma questão de tamanha gravidade, a de que o tráfego aéreo brasileiro tornou-se perigoso por falta de formação de pessoal, teria passado incólume pela campanha da oposição. Que a exemplo daquilo que os marqueteiros presidenciais conseguiram com Geraldo Alckmin em relação às privatizações conseguiria pregar na testa de Lula que seu governo fora o responsável pela tragédia com o Boeing da Gol. Difícil calcular que tipo de estrago isto faria, somado à trapalhada do dossiê Vedoin.

Daqui a uma semana, com os vôos acontecendo dentro daquilo que se considera normal, ninguém lembrará mais das confusões da semana passada. Nem da irresponsabilidade de classificar uma questão de tal importância pela cínica classificação de "apagão".

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