Oitavo mandamento: Mentirás
A grande midia, até um tempo atrás, dizia que a pobreza estava batendo em retirada no mundo. Agora, os burocratas mais bem pagos do mundo estão confessando que estavam mal informados. Também ficamos sabeno, agora, que os países pobres são bem mais pobres do que os números diziam.
Uma mentira
Até um tempinho atrás, a grande mídia nos presenteava, a cada dia, números alegres sobre a luta internacional contra a pobreza. A pobreza estava batendo em retirada, apesar de que os pobres, mal informados, não tomavam conhecimento da boa notícia. Os burocratas mais bem pagos do planeta estão confessando, agora, que os mal informados eram eles.
O Banco Mundial deu a conhecer a atualização do seu International Comparison Program. Do trabalho participaram, junto com o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, as Nações Unidas, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico e outras instituições filantrópicas.
Nele os especialistas corrigem alguns errinhos dos relatórios anteriores.
Entre outras coisas, ficamos sabendo agora de que os pobres mais pobres do mundo, os chamados “indigentes”, somam quinhentos milhões a mais do que aparecia nas estatísticas.
Além disso, percebemos de repente que os países pobres são bem mais pobres do que os numerinhos diziam, e que sua desgraça piorou enquanto o Banco Mundial estava vendendo-lhes a pílula da felicidade do mercado livre.
E se todo isso ainda fosse pouco, agora ficamos sabendo que a desigualdade universal entre pobres e ricos tinha sido mal medida, e em escala planetária o abismo é ainda mais fundo que o do Brasil, país injusto por excelência.
Outra mentira
Ao mesmo tempo, um ex-vice-presidente do Banco Mundial, Joseph Stiglitz, em um trabalho conjunto com Linda Bilmes, investigou os custos da guerra do Iraque.
O presidente George W. Bush tinha anunciado que a guerra poderia custar, no máximo, 50 bilhões de dólares, que a primeira vista não parecia caro demais, tratando-se da conquista de um país tão rico em petróleo. Eram números redondos ou, melhor dizendo, quadrados. A carnificina do Iraque já dura mais de cinco anos, e neste período os Estados Unidos já gastaram um trilhão de dólares matando civis inocentes. Caindo das nuvens, as bombas matam sem saber a quem. Embaixo da mortalha de fumaça, os mortos morrem sem saber por quê. Aquele cálculo de Bush basta para financiar somente um trimestre de crimes e discursos. O número mentia, a serviço desta guerra, nascida de uma mentira e que mentindo continua.
E mais uma mentira
Quando todo o mundo já sabia que no Iraque não existiam outras armas de destruição massiva que as usadas por seus invasores, a guerra continuou, apesar de já ter esquecido seus pretextos.
Então, em 14 de dezembro do ano 2005, os jornalistas perguntaram quantos iraquianos tinham morrido nos dois primeiros anos da guerra.
E o presidente Bush falou desse tema pela primeira vez. Respondeu:
– Uns trinta mil, mais ou menos.
E a seguir fez uma piada, confirmando seu sempre oportuno senso de humor; e os jornalistas riram.
No ano seguinte, reiterou esse número.
Não esclareceu que os trinta mil referiam-se aos civis iraquianos cuja morte tinha aparecido nos jornais. O número real era muito maior, como ele bem sabia, porque a maioria das mortes não é publicada; e bem sabia, também, que entre as vítimas havia muitos velhos e crianças.
Essa foi a única informação proporcionada pelo governo dos Estados Unidos sobre a prática de tiro ao alvo contra os civis iraquianos. O país invasor só contabiliza, em uma conta detalhada, seus soldados caídos. Os demais são inimigos, ou danos colaterais, que não merecem ser contados. E, de qualquer jeito, contá-los poderia ser perigoso: essa montanha de cadáveres poderia causar má impressão.
E uma verdade
Bush estava vivendo seus primeiros tempos na presidência quando, no dia 27 de julho do ano 2001, perguntou aos seus compatriotas:
– Vocês podem imaginar um país que não fosse capaz de cultivar alimentos suficientes para alimentar sua população? Seria uma nação exposta às pressões internacionais. Seria uma nação vulnerável. E por isso, quando falamos da agricultura americana, na verdade falamos de uma questão de segurança nacional.
Dessa vez, o presidente não mentiu. Ele estava defendendo os fabulosos subsídios que protegem o meio rural do seu país. “Agricultura americana” significava, e significa ainda, nada mais do que “Agricultura dos Estados Unidos”.
Contudo, é o México, outro país americano, que melhor ilustra seus acertados conceitos. Desde que assinou o tratado de livre comércio com os Estados Unidos, o México não cultiva alimentos suficientes para as necessidades da sua população; assim, é uma nação exposta às pressões internacionais e é uma nação vulnerável, cuja segurança nacional corre grave perigo:
- Atualmente, o México compra dos Estados Unidos 10 bilhões de dólares em alimentos que poderia produzir;
- Os subsídios protecionistas tornam impossível a concorrência;
- Ao passo que vamos, daqui a pouco as tortillas mexicanas só continuarão sendo mexicanas pelas bocas que as comem, mas não pelo milho de que são feitas, importado, subsidiado e transgênico;
- O tratado prometeu prosperidade comercial, mas a carne humana, camponeses falidos que migram, é o principal produto mexicano de exportação.
Há países que sabem se defender. São poucos. Por isso são ricos. Há outros países treinados para trabalhar pela própria perdição. São quase todos os outros.
Tradução: Naila Freitas / Verso Tradutores
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