segunda-feira, 26 de maio de 2008

A maldição de Fernando Collor


Todos os que envolveram com o ex-presidente enfrentaram grandes reveses em suas vidas, e alguns até destinos trágicos Divulgação

Fernando Collor de Mello O ex-presidente e atual senador Fernando Collor (PTB-AL) é lacônico quando comenta a história de que paira uma maldição sobre as cabeças daqueles que contribuíram ativamente para o seu impeachment, em 1992. “Sou uma pessoa que crê em Deus. Deus põe, Deus dispõe”, diz ele.

O fato é que, um a um, todos os principais protagonistas da investigação que desvendou o esquema de corrupção comandado por Paulo César Farias, ex-tesoureiro de Collor, acabaram passando por martírios – em alguns casos bem maiores que os do próprio ex-presidente.

É uma fieira de mortes trágicas, doenças graves, acidentes, cassações e reputações comprometidas. É daí que surgiu a idéia de uma “maldição do impeachment”. A última vítima dessa praga parece ter sido o prefeito de Nova Iguaçu, Lindberg Farias. Ex-presidente da União Nacional dos Estudantes durante o processo de impeachment, Lindberg foi o principal líder da “geração cara-pintada” que, vestida de preto, saiu às ruas pedindo a deposição de Collor.

Era o início de uma trajetória que pretendia galgar Lindberg à condição de jovem líder político. Lula apostava alto nele como nova geração petista na qual se deveria investir. Colhido pelas denúncias publicadas, Lindberg agora responde a processo movido pelo Ministério Público. Poderá ficar inelegível nas eleições de outubro. No mínimo, será um dissabor grande para quem começou a política chamando Collor de “ladrão”.

Collor rejeita a tal maldição. Repete que é católico, devoto de Nossa Senhora de Fátima (ele anda sempre com um button com a imagem da santa na lapela, ao lado do button dourado de senador). “Inventam muitas coisas a meu respeito”, diz ele. Mas o fato é que sua ex-mulher Rosane Collor e uma ex-mãe-de-santo, Maria Cecília da Silva, têm repetido com freqüência que sessões de magia negra aconteciam nos jardins da Casa da Dinda, a mansão que a família de Collor tem no Lago Norte de Brasília, onde ele morava quando era presidente. Rosane e a ex-Mãe Cecília – assim ela era conhecida quando mãe-de-santo – se converteram ambas à igreja evangélica El Shaddai.

A última vez que Rosane contou detalhes sobre as sessões de magia negra foi ao jornal evangélico Folha Universal, no dia 28 de fevereiro. Segundo Rosane disse ao jornal, Collor acreditava que “os trabalhos poderiam mandar o mal de volta” sobre quem desejava algo ruim a ele. De acordo com o que relatam Rosane e a ex-Mãe Cecília, galinhas e outros animais eram sacrificados durante esses rituais.

O que Collor de fato fazia nos famosos jardins da Dinda, só quem esteve presente pode saber. A verdade, porém, é que o destino daqueles que se opuseram a ele e foram protagonistas do processo de impeachment realmente impressiona. A começar por seu irmão Pedro Collor, autor da primeira denúncia contra o ex-presidente. Ainda enquanto se desenrolava o processo, Pedro Collor descobriu que tinha um tumor maligno no cérebro.

A doença avançou de forma rápida e, dois anos depois, em 1994, o irmão mais novo de Collor morreu. É verdade, porém, que o câncer parece ser um fator genético na família. O irmão mais velho de Collor, Leopoldo, também padece em São Paulo com a doença.


Francisco Eriberto França, O PRIMEIRO DEDO-DURO DA NOVA REPÚBLICA. O Outro, foi NILDO, O CASEIRO

O outro principal denunciante do esquema, Francisco Eriberto França, tem sofrido problemas com os quais ele não contava quando resolveu dizer o que sabia. Eriberto era motorista da Presidência e resolveu contar à ISTOÉ que muitas vezes era encarregado de pegar dinheiro de propinas no escritório de Collor e do ex-piloto de seu avião a jato, conhecido por Morcego Negro, Jorge Bandeira de Mello. Embora não esperasse necessariamente recompensas, Eriberto sonhava com algum reconhecimento. Chegou a tentar a vida política. Fracassou.

Depois de pular por vários empregos, chegou ao fundo do poço, vivendo por alguns anos como guardador de carros nas ruas, quando não chegava a tirar R$ 300 por mês. Hoje, vive com um salário de R$ 1,8 mil como auxiliar de produção na Radiobrás, TV estatal do governo.

Eriberto não fala diretamente sobre uma possível maldição, mas uma das suas maiores rotinas é reclamar da falta de sorte. “Às vezes, bate um certo arrependimento”, confessa. “Esperava um pouco mais dos políticos que me incentivaram a contar o que eu sabia”, considera.

Pivô do escândalo que culminou com o impeachment, PC Farias nunca rompeu publicamente com Collor. Mas os dois afastaram-se após a deposição do ex-presidente. PC chegou a fugir do País para não ser preso. Fala-se na existência de dinheiro que PC arrecadou e nunca apareceu. De qualquer modo, em 1996, Paulo César Farias foi assassinado em sua casa na praia de Guaxuma, ao lado de sua namorada, Suzana Marcolino.

No campo das mortes trágicas, há ainda a do deputado Ulysses Guimarães, que, com seu prestígio, ajudou a sepultar as chances de Collor ao cunhar uma frase histórica pouco antes da votação que aprovou na Câmara o início do processo de impeachment. Collor o havia chamado de senil. “Sou velho, mas não sou velhaco”, respondeu Ulysses. O Senhor Diretas e Senhor Constituinte não chegou sequer a assistir à deposição de Collor.

Em outubro de 1992, um helicóptero que transportava Ulysses caiu no mar próximo de Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. O deputado desapareceu e seu corpo jamais foi encontrado.

Os políticos envolvidos com o impeachment, procurados por ISTOÉ, evitaram falar em maldição, até por não quererem admitir publicamente que passaram ou passam por maus momentos. Ibsen Pinheiro, que presidia a Câmara, foi cassado dois anos depois, envolvido no escândalo dos anões do Orçamento. Benito Gama e Amir Lando, respectivamente presidente e relator da CPI do PC, estão hoje no ostracismo político, recolhidos aos seus Estados de origem, Bahia e Rondônia, por não conseguirem mais se reeleger.


A vítima mais recente foi o senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Na era collorida, Renan era o líder do governo na Câmara. Depois que estourou o escândalo, acabou rompendo com o ex-presidente e, numa entrevista, confirmou a existência do esquema. Durante um bom tempo, ele parecia ter escapado da maldição. Virou ministro da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso e presidente do Senado na era Lula.

Quando tudo parecia lhe sorrir, justamente no momento em que Collor elege-se senador, aparece a história de que ele tivera uma relação extraconjugal com a jornalista Mônica Veloso e que, dessa relação, nascera uma filha. Da briga por pensão, surgiram denúncias de corrupção e enriquecimento ilícito. Para escapar da cassação, que parecia iminente, Renan renunciou à presidência do Senado.

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