Pedro Porfírio
"Vê-los respondendo por seus crimes não é revanchismo, é, isto sim, a oportunidade que se lhes dá de demonstrarem à sociedade que praticaram esses atos, segundo dizem, para salvar o País do perigo comunista". (Luiz Carlos Moreira, capitão-de-mar-e-guerra da reserva e advogado)
Não dá para segurar o grito que estava parado no ar. Os brasileiros não são piores do que os argentinos, uruguaios e chilenos, que deram o devido tratamento aos que praticaram crimes comuns continuados dentro das instalações militares naqueles dias em que quase toda a América do Sul vivia sob o terror de ditaduras impiedosas, que cometeram as mesmas atrocidades.
À margem dos que insistem em solidarizar-se com a violência institucionalizada daqueles idos, há vozes de indignação entre os que, tendo servido às Forças Armadas com o zelo profissional, podem hoje expressar-se por estarem aposentados.
É o caso do coronel-médico Levi Inimá Miranda, reformado como incapaz em julho de 2007, depois de ter denunciado ao Ministério Público Militar uma coleção de punições de que foi vítima: cinco advertências, três repreensões e uma prisão disciplinar.
Rompendo o silêncio
É de sua lavra o libelo que me foi dirigido e que transcrevo na íntegra, com o único objetivo de tornar pública as "vozes do silêncio": "Cumprimentando-o, quero lhe dizer da minha estupefação quanto ao revide, por parte do Clube Militar, no que tange à questão da anistia. Pior que a forma com que o tema foi abordado por militares, foi a presunção do presidente do Clube Militar, quando se pronunciou em nome do povo brasileiro.
Isto foi de um atrevimento inominável.
Também descabida foi a comparação entre as atrocidades outrora cometidas pelos órgãos de repressão, capitaneados pelo Exército, e a [ suposta ] corrupção reinante no governo atual, protagonizada por membros do PT e também por parte de membros de partidos da base governista.
E, por fim, mais uma vez pecou o presidente do Clube Militar ao falar sobre `supostas torturas' praticadas por militares. Ele bem sabe tudo quanto ocorreu, a partir da Oban, dos DOI-Codi, do Dops etc., bem como também da Escola das Américas... E a história traz inúmeros exemplos, como Edson Luís Lima Souto, Manuel Fiel Filho, Vladimir Herzog, Rubens Paiva, Stuart Angel etc.
E farta literatura há a respeito das atrocidades cometidas, bem como toda metodologia danosa e macabra (o pau-de-arara; o "esticador"; a palmatória; a cadeira do dragão; a "pimentinha; o "afogamento"; etc.), além da criação de "cemitérios clandestinos"; as queimas de corpos em pneus (no Araguaia) e em automóveis (na grande São Paulo); as amputações de mãos; as decapitações; as trocas de cabeças realizadas no IML de São Paulo, com a participação de peritos legistas, no intuito de trocar as identificações por odontogramas cadavéricos; a tutela de laudos cadavéricos, assinados por peritos legistas acumpliciados com aquele regime de exceção; etc.
Não só as torturas e todo o morticínio realizados devemos às Forças Armadas. A elas devemos grande parte da gênese de todos os matizes de violência que hoje nos assola, enquanto cidadãos. Devemos muito ao Art. 27 da Lei de Segurança Nacional, que promoveu a mistura de presos comuns com presos políticos, e que inspirou os criminosos comuns, dando surgimento ao Grupo União, depois denominado Falange Vermelha e, por fim, Comando Vermelho; e, hoje, a todas as facções criminosas existentes.
As formas de ocultações de cadáveres, empregadas pela repressão, hoje inspiram traficantes e grupos de extermínio, externadas pelos cemitérios clandestinos, espostejamentos, esquartejamentos, decapitações, carbonizações de cadáveres, quer através de pneus ou mesmo na queima de veículos automotivos. Os criminosos muito aprenderam com os órgãos de repressão.
Qualquer militar que seja dotado de alguma intelectualidade, e que seja estudioso e leitor contumaz, bem sabe que o golpe militar de 1° de abril foi a derradeira tentativa de ditadura plena, e a única que efetivamente vingou; e que toda a filosofia golpista principiou na Escola Superior de Guerra, com o chamado "Grupo da Sorbonne", sempre com a participação, em todas as fases evolutivas, de Golbery. Tivemos a ditadura do marechal Deodoro da Fonseca; a ditadura do marechal Floriano Peixoto, que derrubou Deodoro; o golpe militar frustrado pelo suicídio de Vargas - a ditadura militar foi gestada desde 1954, quando os militares pretendiam que Vargas renunciasse, para assumirem o poder, ou mesmo depondo-o, caso não renunciasse...-; a tentativa de impedir a posse de Juscelino; a tentativa de impedir a assunção de João Goulart, quando da renúncia de Jânio, contornada pelo parlamentarismo, e, por fim, o golpe que depôs Jango.
Após o golpe militar de 1° de abril, ainda promoveram o "golpe dentro do golpe", com a prorrogação do mandato de Castelo Branco. Depois de Castelo, a chegada de Costa e Silva, fiel representante da chamada "linha dura", e que, com sua morte, Médici protagonizou os "Anos de chumbo", época em que efetivamente deram-se as maiores atrocidades. E também os atentados a jornais, as bombas em bancas de jornais, a bomba que vitimou uma secretária na OAB, a bomba do Riocentro e tudo mais.
Ao golpe militar de 64 também devemos a destruição do ensino público e da saúde pública de nosso País. Devemos a ele também o grau de empobrecimento de nosso povo, que se arrasta desde a máxima de que necessário era "fazer o bolo crescer para depois reparti-lo" (Delfin Neto)... Ao golpe também devemos a deterioração de nossas polícias, a partir do momento em que foram tornadas fantoches a serviço da repressão.
Assim, o presidente do Clube Militar minimizou todos os desvarios conseqüentes aos insanos ditadores e seus séquitos torturadores. Que a oficialidade mais nova desconheça a história é explicável, com base na péssima qualidade do ensino vigente; mas ele não pode dizer que desconhece tais fatos.
Historicamente, duas foram as atrocidades fratricidas protagonizadas por militares: Canudos e o golpe militar de 64".
Aguerrido Pedro Porfírio!
"Desconhecer a verdadeira história da ditadura militar, e seus bastidores, é prova de ignorância, diante da tragédia causada ao nosso País e ao nosso povo. Desconhecer a história de tantos mortos e desaparecidos, e de vítimas, vivas, como, por exemplo, você, é, além de ignorância histórica, acumpliciamento culposo com os torturadores e assassinos do sistema atroz de outrora. Jamais nos esqueçamos do capitão Sérgio Macaco.
Por fim, receba meu apoio, incondicional, às suas palavras, à sua história de brasilidade, de civismo e de moral. Tenho, pelo amigo, os maiores respeito e admiração, assim como também com relação a tantos outros brasileiros que lutaram, que sofreram, que foram imolados e que, em alguns casos, deram suas vidas pelo nosso País e pelo nosso porvir".
"Vê-los respondendo por seus crimes não é revanchismo, é, isto sim, a oportunidade que se lhes dá de demonstrarem à sociedade que praticaram esses atos, segundo dizem, para salvar o País do perigo comunista". (Luiz Carlos Moreira, capitão-de-mar-e-guerra da reserva e advogado)
Não dá para segurar o grito que estava parado no ar. Os brasileiros não são piores do que os argentinos, uruguaios e chilenos, que deram o devido tratamento aos que praticaram crimes comuns continuados dentro das instalações militares naqueles dias em que quase toda a América do Sul vivia sob o terror de ditaduras impiedosas, que cometeram as mesmas atrocidades.
À margem dos que insistem em solidarizar-se com a violência institucionalizada daqueles idos, há vozes de indignação entre os que, tendo servido às Forças Armadas com o zelo profissional, podem hoje expressar-se por estarem aposentados.
É o caso do coronel-médico Levi Inimá Miranda, reformado como incapaz em julho de 2007, depois de ter denunciado ao Ministério Público Militar uma coleção de punições de que foi vítima: cinco advertências, três repreensões e uma prisão disciplinar.
Rompendo o silêncio
É de sua lavra o libelo que me foi dirigido e que transcrevo na íntegra, com o único objetivo de tornar pública as "vozes do silêncio": "Cumprimentando-o, quero lhe dizer da minha estupefação quanto ao revide, por parte do Clube Militar, no que tange à questão da anistia. Pior que a forma com que o tema foi abordado por militares, foi a presunção do presidente do Clube Militar, quando se pronunciou em nome do povo brasileiro.
Isto foi de um atrevimento inominável.
Também descabida foi a comparação entre as atrocidades outrora cometidas pelos órgãos de repressão, capitaneados pelo Exército, e a [ suposta ] corrupção reinante no governo atual, protagonizada por membros do PT e também por parte de membros de partidos da base governista.
E, por fim, mais uma vez pecou o presidente do Clube Militar ao falar sobre `supostas torturas' praticadas por militares. Ele bem sabe tudo quanto ocorreu, a partir da Oban, dos DOI-Codi, do Dops etc., bem como também da Escola das Américas... E a história traz inúmeros exemplos, como Edson Luís Lima Souto, Manuel Fiel Filho, Vladimir Herzog, Rubens Paiva, Stuart Angel etc.
E farta literatura há a respeito das atrocidades cometidas, bem como toda metodologia danosa e macabra (o pau-de-arara; o "esticador"; a palmatória; a cadeira do dragão; a "pimentinha; o "afogamento"; etc.), além da criação de "cemitérios clandestinos"; as queimas de corpos em pneus (no Araguaia) e em automóveis (na grande São Paulo); as amputações de mãos; as decapitações; as trocas de cabeças realizadas no IML de São Paulo, com a participação de peritos legistas, no intuito de trocar as identificações por odontogramas cadavéricos; a tutela de laudos cadavéricos, assinados por peritos legistas acumpliciados com aquele regime de exceção; etc.
Não só as torturas e todo o morticínio realizados devemos às Forças Armadas. A elas devemos grande parte da gênese de todos os matizes de violência que hoje nos assola, enquanto cidadãos. Devemos muito ao Art. 27 da Lei de Segurança Nacional, que promoveu a mistura de presos comuns com presos políticos, e que inspirou os criminosos comuns, dando surgimento ao Grupo União, depois denominado Falange Vermelha e, por fim, Comando Vermelho; e, hoje, a todas as facções criminosas existentes.
As formas de ocultações de cadáveres, empregadas pela repressão, hoje inspiram traficantes e grupos de extermínio, externadas pelos cemitérios clandestinos, espostejamentos, esquartejamentos, decapitações, carbonizações de cadáveres, quer através de pneus ou mesmo na queima de veículos automotivos. Os criminosos muito aprenderam com os órgãos de repressão.
Qualquer militar que seja dotado de alguma intelectualidade, e que seja estudioso e leitor contumaz, bem sabe que o golpe militar de 1° de abril foi a derradeira tentativa de ditadura plena, e a única que efetivamente vingou; e que toda a filosofia golpista principiou na Escola Superior de Guerra, com o chamado "Grupo da Sorbonne", sempre com a participação, em todas as fases evolutivas, de Golbery. Tivemos a ditadura do marechal Deodoro da Fonseca; a ditadura do marechal Floriano Peixoto, que derrubou Deodoro; o golpe militar frustrado pelo suicídio de Vargas - a ditadura militar foi gestada desde 1954, quando os militares pretendiam que Vargas renunciasse, para assumirem o poder, ou mesmo depondo-o, caso não renunciasse...-; a tentativa de impedir a posse de Juscelino; a tentativa de impedir a assunção de João Goulart, quando da renúncia de Jânio, contornada pelo parlamentarismo, e, por fim, o golpe que depôs Jango.
Após o golpe militar de 1° de abril, ainda promoveram o "golpe dentro do golpe", com a prorrogação do mandato de Castelo Branco. Depois de Castelo, a chegada de Costa e Silva, fiel representante da chamada "linha dura", e que, com sua morte, Médici protagonizou os "Anos de chumbo", época em que efetivamente deram-se as maiores atrocidades. E também os atentados a jornais, as bombas em bancas de jornais, a bomba que vitimou uma secretária na OAB, a bomba do Riocentro e tudo mais.
Ao golpe militar de 64 também devemos a destruição do ensino público e da saúde pública de nosso País. Devemos a ele também o grau de empobrecimento de nosso povo, que se arrasta desde a máxima de que necessário era "fazer o bolo crescer para depois reparti-lo" (Delfin Neto)... Ao golpe também devemos a deterioração de nossas polícias, a partir do momento em que foram tornadas fantoches a serviço da repressão.
Assim, o presidente do Clube Militar minimizou todos os desvarios conseqüentes aos insanos ditadores e seus séquitos torturadores. Que a oficialidade mais nova desconheça a história é explicável, com base na péssima qualidade do ensino vigente; mas ele não pode dizer que desconhece tais fatos.
Historicamente, duas foram as atrocidades fratricidas protagonizadas por militares: Canudos e o golpe militar de 64".
Aguerrido Pedro Porfírio!
"Desconhecer a verdadeira história da ditadura militar, e seus bastidores, é prova de ignorância, diante da tragédia causada ao nosso País e ao nosso povo. Desconhecer a história de tantos mortos e desaparecidos, e de vítimas, vivas, como, por exemplo, você, é, além de ignorância histórica, acumpliciamento culposo com os torturadores e assassinos do sistema atroz de outrora. Jamais nos esqueçamos do capitão Sérgio Macaco.
Por fim, receba meu apoio, incondicional, às suas palavras, à sua história de brasilidade, de civismo e de moral. Tenho, pelo amigo, os maiores respeito e admiração, assim como também com relação a tantos outros brasileiros que lutaram, que sofreram, que foram imolados e que, em alguns casos, deram suas vidas pelo nosso País e pelo nosso porvir".
Coronel-médico Levi Inimá Miranda, reformado como incapaz em julho de 2007, depois de ter denunciado ao Ministério Público Militar uma coleção de punições de que foi vítima: cinco advertências, três repreensões e uma prisão disciplinar.
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