terça-feira, 2 de setembro de 2008

Os grampos do bem

"Não há paranóia na suspeita de que a gravação sem motivo —e gratuitamente divulgada, sabe-se lá por quem —tenha o único objetivo de desmoralizar os grampos do bem. Se não foi por isso, quem se habilita a sugerir outro motivo, igualmente lógico"?

Luiz Garcia

A quem aproveita o crime? Esse bordão da literatura policial tem uma virtude comum a todos os bordões: é sempre pertinente.

Parece mesmo boa idéia apurar a quem interessaria desmoralizar o uso de gravações de telefonemas na detecção de crimes. Em algumas trincheiras da guerra contra o crime um Sony pode ser bem mais eficiente do que um Smith & Wesson — principalmente no que se refere aos bandidos de colarinhos brancos. Brancos e sujos, claro.

É curioso que esse sucesso não ensine nada aos fora-da-lei. Não dá para entender: por que o pessoal ainda faz tanta questão de tramar, comentar e celebrar seus crimes por telefone? Principalmente quando os conspiradores sabem que suas malandragens quase sempre só podem ser detectadas e provadas por gravações.

Seja como for, essa pergunta corre o risco de ficar obsoleta em pouco tempo: o grampo está seriamente arriscado a sair de moda.

Aparentemente, por culpa dos próprios grampeadores. A gravação da conversa entre o presidente do Supremo Tribunal Federal e um senador do DEM não é apenas um episódio constrangedor, ofensivo, lamentável. A sua aparente gratuidade precisa ser levada em conta — e, se possível, explicada. A quem interessaria gravar um diálogo inteiramente inocente? A invasão de privacidade foi cometida na Agência Brasileira de Inteligência, por alguém que trabalha lá; que se saiba, por conta própria. O caso está sendo investigado num clima de indignação generalizada.

Será uma pena se esse justificado estado de espírito acabar atropelando o bom senso. Não há paranóia na suspeita de que a gravação sem motivo —e gratuitamente divulgada, sabe-se lá por quem —tenha o único objetivo de desmoralizar os grampos do bem. Se não foi por isso, quem se habilita a sugerir outro motivo, igualmente lógico? Em qualquer hipótese, será pouco inteligente permitir que a indignação no Congresso e no STF seja aproveitada para desmoralizar um instrumento legítimo de trabalho policial. É perfeitamente possível realizar uma faxina em regra nas repartições policiais sem jogar os gravadores no lixo.

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