domingo, 18 de janeiro de 2009

Pompeo elogia Tarso por concessão de asilo a Cesare Battisti


Deputado diz que ministro da Justiça cumpriu a Constituição que que veda extradição motivada por crimes políticos


O presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, Pompeo de Mattos (PDT-RS), elogiou ontem a concessão de asilo político ao italiano Cesare Battisti.


Em nota, o deputado afirmou que o ex-ativista foi preso em "caráter de excepcionalidade". "Ao conceder refúgio político a Cesare Battisti no Brasil, o Estado brasileiro age em inequívoca consonância com nossa Carta Magna, que veda a extradição motivada por crimes políticos e estatui que, neste país não haverá penas de morte ou de caráter perpétuo", disse Mattos.


Outros brasileiros também comemoraram a decisão. O cineasta Silvio Tendler disse que é importante o Brasil "defender os direitos de uma pessoa que está sendo vítima de perseguição" e comparou o caso ao da alemã Olga Benário, que foi deportada pelo Brasil e morta em um campo de concentração.


O escritor Celso Lungaretti, que comemorou a decisão no site Liberdade a Cesare Battisti http://cesarelivre.org, disse que, com a concessão do refúgio, o Brasil conseguiu manter a sua "postura de respeito aos direitos humanos". (ANA FREITAS)

Folha de São Paulo - 15/01/2008




MOÇÃO DE APOIO

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados manifesta seu apoio ao pedido de Refúgio Político ao CONARE, em que é requerente CESARE BATTISTI. Para melhor justificar as razões que levam este colegiado a compreender que esta é a posição que melhor se alinha com os preceitos do Direito Internacional Público e com os atos multilaterais de Direitos Humanos, faz-se necessário resgatar as circunstâncias histórico-políticas das quais emergiu este caso reconhecidamente complexo:


1. No contexto bipolar da Guerra Fria, Cesare Battisti, então com menos de 20 anos de idade, engajou-se na década de 70 na militância política da esquerda Italiana;

2. É reconhecido como fato histórico que o Estado Italiano exercia um papel persecutório a militantes de esquerda. Francesco Cossiga, ex-Ministro do Interior e Ex-Primeiro Ministro da Itália, durante esse período, foi ferrenho opositor das esquerdas. Décadas depois, Cossiga provocaria "a hostilidade do establisment político e da OTAN ao tornar pública a existência da Operação Gladio e seu papel nessa organização(...)".

3. "Foi apurado que os serviços secretos norte-americanos e da OTAN realizaram atividades terroristas "sob falsa bandeira", causando numerosas vítimas entre a população civil. O objetivo era culpar os grupos de esquerda pelos atos de terror, a fim de incitar a opinião pública contra os comunistas e assim justificar medidas de exceção, por parte do Estado."1 Era a implantação da "Estratégia da tensão". Nesse contexto, de 1969 a 1984, ocorreram diversos atentados na Itália incluídos na estratégia da tensão;

4. Foram editados vários instrumentos normativos de exceção: a Lei Reale, que dá poderes à polícia para que efetue buscas, e a prisão sem mandado judicial apenas por suspeição; a Lei Cossiga, que ampliou para 11 anos a prisão preventiva em casos de subversão, e a criação do programa de arrependimento que conferia impunidade àqueles que "confessassem" e, na prática, incriminassem as pessoas que o Estado Italiano indicasse como culpados; o artigo 270 bis, do Código Penal Italiano que possibilita a acusação de pessoas por participação em movimentos subversivos sem que o Estado necessite provar o alegado;

5. Neste contexto de excepcionalidade política e jurídica, Cesare Battisti foi preso em 1979 e condenado a uma pena de 12 anos e 10 meses, por participação em ações subversivas e contrárias à ordem do Estado. Não lhe foi imputado nenhum homicídio ou ação terrorista, e em sua sentença foi considerado um militante cujas atividades não redundaram em mortes ou em qualquer ato terrorista. Em 1981, Battisti fugiu da prisão. Esteve na França e fugiu para o México onde passou a viver como escritor e editor de uma revista;

6. Em 1982, Pietro Mutti, fundador do PAC (Proletários Armados para o Comunismo), utiliza-se dos benefícios da Lei dos Arrependidos para imputar a Cesare Battisti a responsabilidade pelas atividades do grupo;

7. A partir da Doutrina Mitterrand, que garantia o asilo e a não extradição de perseguidos políticos, Battisti solicitou e obteve asilo na França. Lá constituiu família e continuou a escrever e a denunciar as ações perpetradas pela extrema-direita da Itália, durante os anos de chumbo. A Itália solicitou à França a extradição de Cesare Battisti. O pedido foi denegado;

8. Já com cidadania francesa, Cesare Battisti teve novo pedido de extradição feito pelo governo de Silvio Berlusconi, sob o argumento de que havia sido condenado à prisão perpétua na Itália e à revelia, por homicídios que teria praticado quando integrava o grupo de ações armadas;

9. A imprensa Italiana noticiou que o Governo Francês teria trocado a extradição dos refugiados políticos italianos pelo voto da Itália no Tratado Constitucional Europeu, pela autorização de que a TGV operasse no trecho Lyon-Turim e pela aquisição de Airbus pela Itália.

10. O segundo pedido de extradição foi deferido e, com receio de vir a ser morto nas prisões italianas, Cesare Battisti fugiu para o Brasil.

11. Atualmente responde a Processo de Extradição junto ao STF.

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias compreende que o pedido de extradição de CESARE BATTISTI rompe com todo o garantismo penal.

A Legislação Brasileira é clara quando normatiza a extradição, tal qual o faz no Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/80), artigo 77, incisos III e VII, in verbis:

"Não se concederá a extradição quando:

(...)

III – O Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o crime imputado ao extraditando;

(...)

VII – o fato constituir crime político";(O grifo é nosso)

A Carta Magna Brasileira veda a extradição motivada por crimes políticos e estatui que, neste país não haverá penas de morte ou de caráter perpétuo (art. 5º, XLVII, "a" e "b"). Tal reciprocidade não se encontra no Tratado de Extradição estabelecido entre as Repúblicas do Brasil e da Itália e objeto do Decreto nº 863, de 09 de Julho de 1993.

Recentemente, o posicionamento do então Ministro da Justiça, Clemente Mastella, comprova a pretensão da Itália em manter em cárcere perpétuo o escritor Cesare Battisti. A confirmação é publica e consta da edição de 11/10/2007, às 19h32min, do jornal eletrônico il Giornale.it. Nele, Mastella explica que sua afirmação às autoridades brasileiras de que Battisti não seria penalizado com pena perpétua tratava-se, em verdade, de um estratagema para garantir a extradição do mesmo. A matéria noticia que o Ministro Italiano asseverou que Cesare não receberia nenhum benefício penitenciário.

Os crimes contra a humanidade, terrorismo e tortura, sábia e prudentemente têm sido julgados pelo Tribunal Penal Internacional. Justifica-se tal prudência capitaneada pelo Direito Internacional Público, face aos conflitos entre as forças internas dos países.

Desse modo, entendemos que, em razão do tempo e do contexto histórico em que o senhor CESARE BATTISTI se encontrava, não se justifica mais a tentativa de lhe imputar prisão perpétua e, possivelmente, risco de morte dentro de cárceres italianos, sob o pretexto de se fazer justiça ou possível reparação social, histórica e moral naquele País, até porquê a princípio foi julgado e condenado por crime de subversão e não de terrorismo ou homicídio. A acusação posterior de homicídio adveio após sua fuga para o México e a utilização das benesses da Lei dos Arrependidos por Pedro Mutti, ex-chefe da organização na qual Battisti militara.

Assim, a CDHM confia na avaliação prudente, serena e racional do CONARE, composto de pessoas públicas com larga experiência em questões dessa natureza. Sem dúvida, saberão agir à revelia das paixões ideológicas e subjetivas latentes no pedido de extradição, bem como possíveis interesses políticos de ocasião, e decidirá sob o manto dos preceitos constitucionais, dos princípios e tratados internacionais dos direitos humanos e da racionalidade jurídica.

Brasília, 03 de setembro de 2008.

Deputado POMPEO DE MATTOS
Presidente

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