NA LÓGICA DA PROPRIEDADE E DO CAPITAL
Mário Augusto Jakobskind
E começou o ano civil de 2009. Muitas águas vão rolar e finalmente se verá até que ponto a crise econômica vai provocar ainda maiores estragos do que já provocou até agora. Os eternos defensores do neoliberalismo, os tais colunistas de sempre, que até há pouco defendiam ardorosamente o Estado mínimo, agora são os primeiros a saudar a presença do Estado para salvar quem está afundando. Esta é a tal lógica da propriedade e do capital, que se manifesta das mais diversas formas.
Um dos maiores exemplo desta lógica é nada mais nada menos do que o Ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal, cargo que jamais poderia estar ocupando, pois a sua prática parcial em favor da propriedade e do capital não se coaduna com o posto.
A mais recente defesa dessa lógica protagonizada pelo Ministro do Supremo nomeado na gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso foi a sua declaração condenando de antemão o MST em um grave incidente em Pernambuco que resultou em quatro mortes. Diante das câmaras da Globo, em plena quarta-feira de cinzas, Mendes vestiu a fantasia fundiária da Vênus Platinada, como também é conhecida a emissora televisiva de maior audiência no país, para também condenar o pagamento de subsídios legais pelo Poder Público à referida entidade que há mais de 25 anos luta pela reforma agrária e tem vários núcleos produzindo. O Estado brasileiro, independente de quem seja o ocupante do Palácio do Planalto, cumpre a função constitucional de colaborar com entidades que produzem na área da agricultura. Mas Mendes não está nem aí, prefere se manifestar seguindo o mesmo ideário da TV Globo e opina sobre um fato com o objetivo de colocar o governo atual no banco dos réus.
Antes de qualquer coisa, o presidente do STF já se posiciona contra o MST, satanizando-o e o julgando através de um incidente ainda não totalmente esclarecido, em poucos segundos jogando o movimento na vala do crime comum. E aí os papagaios de pirata da mídia hegemônica saem repetindo a receita. Segundo dados da CPT (Comissão Pastoral da Terra), de 1985 a 2007, foram cerca de 1500 assassinatos de trabalhadores rurais, muitos deles mortos enquanto defendiam seu direito à terra, o que Mendes não leva em conta pois o Ministro defende a propriedade e o capital e ignora que a violência sempre prejudicou o MST.
Não é à toa que outras decisões polêmicas protagonizadas por Gilmar Mendes são até hoje questionadas e colocadas em dúvida jurídica, como a que em poucas horas concedeu habeas-corpus ao banqueiro Daniel Dantas, considerado um "bandido" pelo delegado Protógenes Queiroz. Por estas e muitas outras, Gilmar Mendes desabona a instância máxima da Justiça brasileira. É o caso de se perguntar se quando Mendes vota em algum processo ou julga a concessão de habeas-corpus ele se posiciona de acordo com trâmites legais ou decide movido por outros motivos? São perguntas necessárias, sobretudo no momento em que o presidente do STF se apresenta em público com uma sentença definitiva e que é utilizado nos mais variados espaços para aprofundar o esquema de criminalização do MST e demais movimentos sociais brasileiros.
Que a TV Globo, que representa interesses econômicos que não aceitam qualquer tipo de organização popular faça isso, não chega a surpreender, agora que o Ministro que preside o STF repita o esquema, significa realmente um retrocesso. A figura de Mendes remete a decisões que mancharam definitivamente o STF, como em 1936 ao aprovar a extradição de Olga Benário, judia e comunista, grávida, para a Alemanha, onde acabou morrendo na câmara de gás de um campo de concentração.
Em suma, desta vez, enquanto o samba atravessava a avenida, a justiça, via STF, desafinava, ao seu presidente se alinhar ao bloco da conveniência do mais forte, que tem como porta-estandarte a TV Globo.
A mesma lógica de Gilmar Mendes foi utilizada pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul ao ordenar o fechamento de oito escolas para crianças do MST que funcionavam regularmente há 13 anos, inclusive seguindo o currículo da Secretaria de Educação gaúcha, que informou que não poderá arcar com o deslocamento das crianças para outras escolas na área rural. Quer dizer, as crianças ficarão sem estudar por culpa do Ministério Público e da governadora Yeda Crusius, do PSDB.
Os argumentos apresentados pelo Ministério Público, através do Procurador da Justiça Gilberto Thums, não só não resistem a menor análise como remetem a um dos períodos mais obscuros da história brasileira, a da ditadura instalada a partir de abril de 1964 e que estendeu a março de 1985.
Thums, que joga na mesma lógica de Mendes e de Yeda Crusius da propriedade e do capital, usa uma terminologia dos tempos da Guerra Fria, que se esperava superado pelos novos tempos em que vive o Brasil. Para a saúde da democracia no país, é urgente que se encontre uma forma de se fazer uma revisão profunda do Poder Judiciário e evitar aberrações do tipo Gilmar Mendes.
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