Escrito por Eduardo Guimarães
Como parte dos esforços para atacar a Globo, a Record fez uma aquisição poderosa: comprou o documentário "Muito Além do Cidadão Kane" ("Beyond Citizen Kane"). A emissora fechou o negócio nesta semana, mas já havia tentado adquirir os direitos de exibição para TV brasileira nos anos 90. Segundo apurou a Folha Online, o material saiu por menos de US$ 20 mil para a emissora do bispo Edir Macedo.
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Produtor John Ellis vendeu os direitos de exibição para Record |
Desde a semana passada, quando Globo e Record começaram a se atracar em rede nacional, o nome da produção voltou à baila. No entanto, quase tudo o que se diz sobre ela --de sua suposta proibição à autoria do trabalho-- é equivocado.
A Record já vinha veiculando trechos do documentário em seus telejornais noturnos antes da aquisição. O filme chegou a ser citado no "Repórter Record" de domingo (16).
Transmitido pela primeira vez em 1993, no Reino Unido, "Muito Além..." mostra o empresário Roberto Marinho (1904-2003) como ícone da concentração da mídia no Brasil --daí a referência a Charles Foster Kane, magnata das comunicações vivido pelo cineasta Orson Welles em "Cidadão Kane" (1941).
Simon Hartog, diretor da obra, morreu em 1992, antes de o trabalho ser exibido. Seu produtor e braço-direito era John Ellis, que se tornou a partir daí o responsável pelo projeto. Ellis deteve, até o começo dessa semana, o direito de exibição do filme em TV aberta no Brasil, agora na mão da Record.
Mesmo legendado de forma capenga, o documentário se transformou num "hit" no país antes da internet ser o que é hoje --ou seja, circulava em VHS. Custou cerca de US$ 260 mil [R$ 445 mil] à extinta empresa Large Door, na qual Hartog e Ellis eram sócios.
A produtora independente fez o longa para o canal britânico Channel 4, responsável por sua transmissão (a BBC nunca teve qualquer ligação com a produção, diferentemente do que a própria Record insiste em divulgar). Curiosidade: uma das maiores audiências do Channel 4 é o "Big Brother", também carro-chefe da Globo.
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Site da Igreja Universal do Reino de Deus destaca o filme "Muito Além do Cidadão Kane" em sua página principal |
Bastidores
Em entrevista ao caderno "Mais!" publicada em fevereiro do ano passado, Ellis revelou que tanto Globo quanto Record tentaram comprar os direitos do filme nos anos 90 --a primeira para engavetá-lo, a segunda pare exibi-lo. Ellis disse também que o título nunca foi proibido ou embargado pela Justiça brasileira.
"A igreja [Universal do Reino de Deus] já tinha uma filial em Londres naquela época [começo dos anos 90]. Mas percebeu que haveria uma disputa judicial com a TV Globo a respeito das muitas imagens retiradas da programação deles. Então decidiu não comprá-lo", relatou o produtor.
Agora, a Record pode se concentrar em exibir os trechos "autorais" do filme, ou seja, limar as imagens da TV Globo e focar nos relatos e entrevistas.
Políticos como Leonel Brizola (1922-2004), Antonio Carlos Magalhães (1927-2007) e Luiz Inácio Lula da Silva --apresentado então como líder sindical-- falam sobre a emissora carioca no filme. "Nada se faz [no Brasil] sem consultar o dr. Roberto Marinho. É assustador", diz o cantor Chico Buarque, no início da fita.
Em outro trecho da entrevista à Folha no ano passado, este inédito, Ellis criticou o envolvimento da Iurd com a Record.
"Por que uma igreja deveria gastar seu dinheiro desse modo [em TV] quando há muitos assuntos urgentes que merecem seu dinheiro e atenção? Como eles respondem a isso?", questionou à época.
A Justiça recebeu neste mês denúncia do Ministério Público de São Paulo e abriu ação criminal contra Edir Macedo, fundador da Iurd, e mais nove integrantes da igreja, sob acusação de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Procurada pela reportagem, a Record não confirmou tampouco negou a compra de "Muito Além do Cidadão Kane".
No Google Videos, o documentário está disponível na íntegra desde fevereiro de 2006. Também aparece hospedado no site da Igreja Universal, o ArcaUniversal.com.br.
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