Uma menção aparentemente gratuita da Polícia Federal no inquérito sobre o mensalão mineiro jogou luz sobre uma das peças-chave do governo de Aécio Neves (PSDB). A referência traz à superfície a discreta jornalista e historiadora Andréa Neves da Cunha, 48 anos, irmã mais velha de Aécio, oficialmente chefe do serviço de assistência social do Estado e comandante de fato da área de comunicação da administração.
Conhecido por delegar funções, Aécio assenta seu governo em um tripé: a parte administrativa está sob o comando do vice-governador Antonio Junho Anastasia, a costura política local fica a cargo do secretário de Governo, Danilo de Castro. Imagem e estratégia estão com a irmã.
Na página 86 do inquérito, trata-se de Lidia Maria Alonso Lima, a beneficiária de um saque de R$ 15 mil de uma das contas controladas pelo publicitário, Marcos Valério de Souza. Como várias outras pessoas da lista, Lidia Maria disse à Polícia que recebeu os recursos a pedido de um candidato, no caso o pemedebista, já falecido, Eduardo Brandão. Em seguida, o relatório detalha: "Lídia Maria na época deste recebimento trabalhava na empresa Comercial Factoring Ltda, de propriedade de Andréa Neves da Cunha. Em outro depoimento, Lidia Maria relata ter feito parte dos quadros societários da empresa Taking Care, juntamente com Andréa Neves".
A menção a Andréa ocorre no momento em que a jornalista comanda a operação para minimizar os danos do noticiário do mensalão sobre seu irmão. Partiu da jornalista, isolada em seu gabinete no Serviço de Assistência do Estado (Servas) e em permanente contato com assessores do governo, a estratégia de aguardar uma semana de repercussão para que Aécio se pronunciasse publicamente.
Hábil em operações de blindagem e preservação de imagem, Andréa Neves só conversa sobre si com jornalistas amigos. Sua única atuação como profissional de imprensa foram algumas reportagens feitas para a revista "Pais e Filhos", nos anos 80. Ao vir para o primeiro plano, atribuiu à sua equipe a tarefa de detalhar sua situação empresarial. Assessores do governo mineiro esclarecem que Andréa foi dona da empresa de factoring entre 1993 a 1999, até a morte do marido e sócio Herval Braz, depois de um ano de luta contra o câncer. Tinha 50% do capital. Em 1996, montou com Herval, também jornalista e editor-chefe do jornal "Hoje em Dia", o segundo mais lido de Belo Horizonte, uma empresa de aluguel de carrinhos de bebê em shopping centers, com o nome em inglês. Ao ficar viúva, fechou a empresa de fomento mercantil e substituiu Herval pelo próprio Aécio, então deputado federal, como sócio da Taking Care.
Eleito governador em 2002, quatro anos depois do depósito de Marcos Valério para a funcionária de Andréia, Aécio saiu da sociedade e foi substituído, durante três anos, por Lidia Alonso. A Taking Care não é a única empresa da jornalista, cuja ascendência sobre o irmão é alvo de uma vasta mitologia em Minas Gerais. Andréa também está à frente da NC (Neves da Cunha) Participações, empresa que gere investimentos em comum dos irmãos (além do governador, há a irmã caçula, Ângela, dona de casa) e principal item patrimonial de Aécio em sua declaração de bens de 2006, quando o governador afirmou possuir cotas de capital no valor de R$ 193,4 mil.
Segundo a jornalista informou por meio da assessoria de imprensa do governo, a NC fora concebida para a administração de imóveis, mas hoje tem como única fonte de renda o aluguel de uma sala comercial na Avenida do Contorno, em Belo Horizonte. Andréa ainda é a responsável por duas emissoras de rádio FM, em Betim e São João del Rey, concessões dadas à família durante o governo Sarney.
Na campanha de 2006, em que Andréa atuou como uma das coordenadoras da reeleição do irmão, ela já havia sido o principal alvo da oposição. E como costuma acontecer na luta política do Estado, de forma indireta: seu nome constou como uma das operadoras no Estado do suposto caixa 2 descrito pela "Lista de Furnas", um documento cuja autenticidade está comprovada pela Polícia Federal, mas cujo conteúdo foi declarado falso pela CPI dos Correios. A lista foi colocada na Internet por militantes do PT mineiro. Andréa também ganhou ares de rainha cortadora de cabeças: circulou na Internet um vídeo onde seis jornalistas a responsabilizam diretamente pelas suas demissões, por terem feito reportagens que teriam desagradado o Palácio da Liberdade. A campanha de Aécio posteriormente conseguiu que dois dos jornalistas desmentissem a versão.
Adversários do PSDB e aliados são quase unânimes em afirmar - sempre sob reserva - que Andréa não cuida da captação de recursos e pagamento de fornecedores nas campanhas que se envolveu - todas as disputadas pelo irmão, desde a fracassada tentativa de se eleger prefeito de Belo Horizonte em 1992. Apesar da negativa do governo do Estado sobre a blindagem do governador, na primeira semana de repercussão do chamado "mensalão mineiro", o tema foi ignorado pelos jornais de Belo Horizonte.
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