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Ministério da Educação é acusado de montar esquema para favorecer universidades privadas, que têm 1,5 milhão de alunos e faturam R$ 5 bilhões por ano
Andrei Meirelles e Ricardo Miranda
O ensino universitário privado no Brasil é um mercado de 1.015 cursos com 1,5 milhão de estudantes, faturamento anual estimado em R$ 5 bilhões e planos para dobrar de tamanho nos próximos quatro anos. Só em 1999, a Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação (CNE) autorizou a abertura de 517 novos cursos País afora, a grande maioria particulares. Esse acelerado aumento de vagas poderia ser apenas uma boa notícia aos milhões de estudantes que pretendem uma melhor qualificação para enfrentar um estreito e cada vez mais exigente mercado de trabalho. A concorrência nesse lucrativo negócio, porém, se transformou numa verdadeira guerra com troca de denúncias entre grandes empresas educacionais que atingem também o CNE e o Ministério da Educação. A Polícia Federal está investigando desde o ano passado uma denúncia de falsificação de pareceres. O caso veio à tona quando o próprio dono da Faculdade Elite de São Paulo foi à sede do CNE para saber se um processo dele já havia sido autorizado. Quando foi informado de que o relator do caso, o conselheiro Roberto Cláudio Bezerra, nem sequer tinha lido o processo, perdeu a paciência e abriu o jogo. "Eu já paguei por isso", protestou o empresário, que tinha nas mãos cópia de um parecer assinado pelo próprio Bezerra aprovando sua faculdade. O parecer foi comprado de um dos muitos escritórios em Brasília que montam processos para reitores de primeira viagem, alguns comandados por ex-integrantes do conselho. O MEC abriu inquérito administrativo, que concluiu que o parecer falso havia sido digitado dentro do CNE, onde também foi falsificada a assinatura do conselheiro. A investigação ainda não foi concluída.
Ab A guerra do canudo
Cabala
Silvino Lopes é subordinado do conselheiro Abílio Afonso Baeta Neves, homem de confiança do ministro Paulo Renato Souza e todo-poderoso comandante da Secretaria de Ensino Superior do MEC. ISTOÉ teve acesso a documentos e fitas de uma reunião do Conselho Nacional da Educação que mostram uma história no mínimo contraditória. Em 4 de outubro do ano passado, os 12 conselheiros do CNE decidiram que a Universidade Bandeirante de São Paulo (Uniban) não poderia abrir cursos em Osasco sem antes cumprir a exigência legal de receber uma autorização do Ministério. "Fazer vestibular, ela pode fazer onde quiser - nos Estados Unidos, no Japão e até no subterrâneo do metrô de Paris. Agora, matricular para cursos lá é uma irregularidade, e nós não teremos nenhuma outra atitude a não ser informar que aquele vestibular é absolutamente ilegal e nulo", sentenciou Baeta, na ocasião. Tudo letra morta. A Uniban, que tem como dono o reitor Heitor Pinto, simplesmente ignorou a proibição e não foi punida, apesar de expressa recomendação do CNE nesse sentido.
Numa reviravolta surpreendente, em janeiro deste ano Baeta passou a aceitar como regular o comportamento da Uniban e entrou em conflito aberto com seu parecer anterior e os colegas conselheiros. Pela legislação atual, uma universidade, para abrir campus fora da sede, precisa apresentar projeto específico ao conselho - como se estivesse criando uma nova universidade. A Uniban argumentou que não precisava dessa licença prévia porque, ao reconhecer a instituição, em 1993, o CNE aceitou Osasco como uma das áreas de influência da Uniban. O CNE não concordou e pediu ao MEC a abertura de inquérito administrativo para investigar irregularidades praticadas pela Uniban e também a suspensão de todos os processos da instituição em tramitação. O caso Uniban virou o primeiro grande impasse entre o MEC e o CNE. O Ministério considerou as propostas do conselho "extremas e desproporcionais" e rejeitou o pedido, que agora será revisto por uma comissão especial. Para complicar a situação, donos de universidades privadas contaram a ISTOÉ que Baeta Neves extrapolou suas funções de funcionário público e cabalou votos para a chapa articulada por Heitor Pinto, que no ano passado disputou e perdeu a eleição da Associação Nacional de Universidades Privadas.
Se a Uniban mostra força no Ministério da Educação, outro que também chama a atenção pelas excelentes relações no CNE, o órgão que julga, emite pareceres e aprova todas as instituições de ensino superior do País, é João Carlos Di Gênio. No final do ano passado, por exemplo, a Uniban resolveu abrir um novo campus em São Paulo. Depois de muita negociação, feita em sigilo, ofereceu em dezembro R$ 8 milhões por um prédio no bairro do Jaguaré. Ali, seria aberto o campus Marginal Pinheiros. Seria. A Uniban negociava o imóvel quando foi informada pela corretora de que a propriedade não estava mais à venda. Tinha sido negociada com uma de suas maiores concorrentes, a Universidade Paulista (Unip), de Di Gênio, que rapidamente abriu lá um campus e realizou seu vestibular, oferecendo 1.500 vagas para nove cursos. Além do vendedor e do candidato a comprador, o negócio só era conhecido dentro do Conselho Nacional de Educação. "Isso é suspeito", atacou o reitor Heitor Pinto. "É uma desculpa de quem perdeu um negócio", contra-ataca Di Gênio, que afirma ter pago R$ 9 milhões pelo prédio pretendido pela Uniban.
http://www.terra.com.br/istoe/1584/brasil/1584guerradocanudo.htm
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