segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O RIO TIETÊ FICOU QUASE TRÊS ANOS SEM SER DESASSOREADO


A atitude da assessoria de imprensa, o fato de que enchentes que não deveriam ter acontecido aconteceram e as chuvas moderadas (nas duas inundações deste ano São Pedro está completamente isento) são fortes indícios de que o governo do Estado do São Paulo pode não ter removido os 380 mil ou 400 mil metros cúbicos de resíduos do Tietê em 2006, 2007 e 2008 (de janeiro a outubro).

Outro indício foi dado pelo engenheiro João Sérgio, responsável pela barragem da Penha, em entrevista à repórter Fabiana Uchinaka, do UOL, quando questionado sobre o fato de que o nível das águas no Jardim Pantanal, à montante da barragem, permanecia alto dias depois das chuvas terem cessado.

Disse o engenheiro:

"Também acho estranho o nível da água não baixar aqui e não sei por que está indo para os bairros, mas não precisa ser especialista para ver que está assoreado [o rio]".

Em português claro: o rio Tietê pode ter ficado quase três anos sem ser desassoreado.

“Como, nem os 400 mil anuais foram retirados em 2006, 2007 e 2008?!”, espantou-se o professor Júlio Cerqueira César. “Eu estive na inauguração da calha do Tietê, e o Geraldo Alckmin anunciou na frente de autoridades, engenheiros, técnicos um contrato para a manutenção da limpeza. Achei ótimo. Agora, faltar com verdade, não cumprir nem isso, já é demais!"

Na época, Geraldo Alckmin afirmou que, por meio de uma Parceria Público-Privada (PPP), um consórcio seria o responsável pela manutenção da calha do rio. O Viomundo apurou que a PPP não vingou. O setor privado não demonstrou interesse. Foi somente no segundo semestre de 2008 que o governo do Estado de São Paulo resolveu licitar o desassoreamento de 400 mil metros cúbicos de sedimentos do Tietê.

“Isso significa que a limpeza do Tietê não foi feita no último ano do Alckmin e nos primeiros dois anos do Serra”, sente-se ludibriado o professor Júlio. “Uma desgraça para a cidade . A situação do Tietê está muito pior do que eu imaginava. Tudo o que se ganhou com o rebaixamento da calha foi perdido!”

Da barragem da Penha ao Cebolão, relembramos, são lançados anualmente no rio Tietê cerca de 1,2 milhão de metros cúbicos (1,2 milhão m³ ) de sedimentos. A partir daí o professor Julio fez as contas:

* 1,2 milhão m³ (em 2006) + 1,2 milhão m³ (2007) + 1 milhão m³ (em 2008, janeiro a final de outubro) = 3,4 milhões de metros cúbicos.

* Portanto, até outubro de 2008, já havia depositado na calha do leito do Tietê um passivo de 3,4 milhões de metros cúbicos.

* Do final de 2008 a dezembro de 2009, segundo a secretária Dilma Pena, removeram-se 380 mil metros cúbicos. Ou seja, permaneceram no Tietê 820 mil metros cúbicos.

* Pois bem, somando os 3,4 milhões de metros cúbicos (não tirados de 2006 a final de 2008) com os 820 mil metros cúbicos (não removidos de 2008 /2009), o rio Tietê está com, pelo menos, 4,2 milhões de metros cúbicos de terra e lixo.

Conclusão 1: Atualmente, estima-se, o Tietê tem ao redor 4,2 milhões de metros de sedimentos depositados no seu leito na capital. É como se quase metade dos 9 milhões de metros cúbicos retirados durante a obra da calha tivesse sido jogada, de novo, dentro do rio.

Conclusão 2: Os 4,2 milhões de metros cúbicos dão uma altura de sedimentos de 4,2 metros. Supera de longe, portanto, os 2,5 metros de aprofundamento da calha.

Conclusão 3: O nível do Tietê voltou ao que era antes das obras da calha; R$ 1,7 bilhão praticamente jogado no lixo.

“Mantido o ritmo de entrar mais sedimentos do que sai, o Tietê vai ‘acabar’ na capital e a cidade submergir”, alerta o professor Júlio Cerqueira César. “É um descalabro.”

“O governo estadual não ter feito nada em quase três anos é muito sério. Toda a capacidade de vazão ganha com a ampliação da calha é perdida”, adverte o geólogo e consultor de geotecnia e meio ambiente Álvaro Rodrigues dos Santos, que já foi responsável pela Divisão de Geologia e diretor de Gestão e Planejamento do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas, de São Paulo). “O Tietê transbordou em setembro e dezembro por estar totalmente assoreado. A vazão máxima dele nessas ocasiões foi de cerca de 700 metros cúbicos/segundo. Se estivesse limpo, seria próxima de 1,100 metros cúbicos /segundo e não teria transbordado.”

“Na verdade, eles [governo estadual] valem-se do desconhecimento técnico da população e da imprensa”, põe o dedo na ferida o geólogo Álvaro dos Santos, e vai fundo. “Com o não desassoreamento, eles sabiam perfeitamente que São Paulo corria o iminente risco de enfrentar tragédias como as de 8 de setembro e 8 de dezembro. Infelizmente em janeiro, fevereiro e março, meses naturalmente mais chuvosos, estaremos, de novo, na alça de mira das inundações. Ameaçou chover? Fuja das marginais. E se você mora em áreas sujeitas a inundações, chame imediatamente os bombeiros!”

O professor Júlio Cerqueira César Neto assina embaixo.

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