sexta-feira, 16 de abril de 2010

Os políticos, a mídia e as chuvas

O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, fez (dia 14) uma declaração corajoa, chamando para si e para as gestões que o antecederam a responsabilidade pelas consequências das fortes chuvas que causaram sérios estragos em muitas cidades fluminenses e, até a tarde daquele dia, já havia provocado a morte de 251 pessoas e desabrigado milhares. O governo estadual também não se omitiu e, desde o primeiro momento, identificou nas falhas da política habitacional e ocupação ilegal de encostas os motivos que agravaram a dimensão da tragédia.

O problema não é novo. Desde a década de 1940 o Rio observa morros e outras áreas de risco serem ocupadas de forma ilegal, desordenada, sem controle do poder público. Pelo contrário, muitas vezes os próprios órgãos governamentais legalizam as moradias em áreas de risco, ampliando o problema.

A atitude dos governos estadual e municipal do Rio contrastam com hipocrisia que marca a gestão de muitos políticos que se recusam a tomar providências quando elas são sugeridas e depois jogam a culpa da tragédia na população. Exemplo claro desse tipo de atitude foi a do governador José Serra que, em 2008, simplesmente vetou projeto de lei aprovado pela Assembleia Legislativa de São Paulo, que determina que o Estado elabore mapeamento e levantamento cadastral das áreas de risco, para adotar medidas que evitem as tragédias. Até agora, nenhuma outra providência foi tomada em SP para minorar o problema.

A hipocrisia, porém, não é exclusiva dos governantes. Chama atenção a diferença gritante entre a cobertura midiática da tragédia no Rio em comparação com as também graves consequências das chuvas em São Paulo nos primeiros meses do ano e que provocaram a morte de 78 pessoas.

No Rio, onde o volume de chuvas foi o maior já observado nos últimos 40 anos, desde o primeiro momento a grande imprensa buscou, não sem razão, responsabilizar o poder público pelas mortes. Já em São Paulo -- estado e capital governados pela dupla tucano-demo Serra-Kassab -- a mídia simplesmente poupou o governador de qualquer crítica e, afinada com o discurso oficial, tratou de responsabilizar única e exclusivamente o grande volume de chuvas pelos transtornos causados à população. As capas da revista Veja sobre as chuvas no Rio e em São Paulo foram reveladoras da falta de escrúpulos da imprensa conservadora em adotar dois pesos e duas medidas em suas opções editoriais claramente partidarizadas.

Não se pode negar que muitas vezes a natureza se manifesta de forma atípica e torna impossível prevenir todas as consequências de uma grande tempestade. Mas também não se pode negar que a maior parte das mortes causadas em consequências das enchentes poderiam ser evitadas se não houvesse omissão do poder público nos períodos que antecedem as chuvas.

Para que novas tragédias como a ocorrida no Rio de Janeiro, em São Paulo no início do ano e agora nesta semana em vários estados do Nordeste não se repitam, é urgente colocar em prática uma política que busque eliminar o déficit habitacional existente nas principais capitais do país, usar efetivamente as verbas que têm sido alocadas para obras de prevenção contra enchentes e coibir a especulação imobiliária que irresponsavelmente acaba levando tantas famílias para áreas de risco. É preciso ainda mapear essas áreas e promover a retirada das famílias que nelas residem, oferecendo alternativas viáveis e dignas de moradia para elas.

 

www.vermelho.org.br

Nenhum comentário:

Marcadores