Por que Serra não gosta da SAE?
Artur Araújo
Serra, o candidato, aventurou-se em território exótico. Foi ser figurante de programa policial, o do Datena. Em ambiente muito distinto dos que costuma frequentar o alto tucanato, decidiu jogar o jogo. E era um tal de engaiola p’ra cá, malditos p’ra lá, que a empolgação o levou à derrapagem: sacou, à queima-roupa, um tal Ministério da Segurança.
Surpreendido por essa crise de “inchaço da máquina”, súbita e distoante, seu entorno foi rápido no gatilho. Até editorial crítico Serra ganhou, publicado por jornal que o apóia, com o título de “Desafinado”. Era inaceitável, para seus pares, um discurso que, ainda que obviamente eleitoreiro, fazia ruído na campanha pelo “estado mínimo; esbelto, porém musculoso”.
Chamado às falas, o candidato perdeu o eixo. Improvisou um mercado de “breganha”, como se diz em Taubaté, e anunciou que, “para compensar”, eliminaria, entre outras, a Secretaria de Assuntos Estratégicos – a SAE -, caso inverta a onda e logre ser eleito.
Para além da evidente irresponsabilidade de conduzir uma campanha para tentar ser presidente de um país, da importância e porte do Brasil, à base de um troca-troca de ocasião, há que se examinar as razões reais da escolha do alvo.
Afinal, um Serra “ex-ministro do Planejamento”, “homem de visão de futuro”, “economista, engenheiro e gestor científico” sempre foi o modelito cantado, em verso e prosa, pelos marqueteiros que se dedicam à montagem de sua imagem pública.
Logo ele, o planejador par excellence, querendo desmontar o principal instrumento de elaboração de estratégias para o Estado brasileiro? Estranho. Porém facilmente explicável.
Recorra-se, por exemplo, à recente entrevista do Ministro Samuel Pinheiro Guimarães, titular da SAE. Ele narra a encomenda que lhe fez, em outubro de 2009, o presidente Lula: um projeto abrangente, articulado e factível para o Brasil aos duzentos anos de sua independência política. A Secretaria dedica-se, desde então, à elaboração e discussão pública, com toda a sociedade, do Plano Brasil 2022.
Estão em circulação, neste momento, apenas as linhas mestras de formulação do Plano. E já bastam para eriçar as penas da “turma dos 30%”, aquela que gosta e quer um Brasil aos pedaços, em que só parte dos brasileiros e trechos do território nacional fazem parte do círculo dos incluídos. O que Lula pediu - e a SAE colocou em debate - é um projeto de Brasil includente e dinâmico, um Brasil que pode muito mais do que imagina ou deseja o pensamento de asas curtas dos tucanos.
Quais são as questões estruturantes desse projeto? De início, aumentar significativamente a participação dos salários na renda nacional. Ou, traduzido para o tucanês, pisar no freio da orgia de ganhos financeiros sem risco, das sobretaxas de lucros, derivadas de oligopólios ou monopólios privados, e distribuir renda de forma mais justa. Em economês neoliberal, heresia.
Outra meta é trazer o Brasil de volta às suas taxas históricas de crescimento – 7% ao ano – e libertar-nos dos “vôos de galinha”, típicos do período 1995-2002, quando atingir um patamar de expansão anual do PIB da ordem de 3% era objeto de comemoração - e de início de pânico nas hostes do “inflacionismo”, pois não concebem um Brasil à altura de seus potenciais.
Mais idéias que alicerçam o Brasil 2022: erradicar o analfabetismo pleno e o funcional; eliminar a pobreza absoluta (pessoas com renda diária abaixo de US$ 2/dia, hoje 21% dos brasileiros); incorporar os beneficiários do Bolsa-Família ao setor produtivo; e reduzir a zero o déficit de seis milhões de moradias.
Nessa entrevista, o ministro Samuel afirmou: “Durante muito tempo, segundo os estudos da OCDE, o Brasil foi um dos países que mais cresceram no mundo, até que entrou
Já o douto Maílson da Nóbrega, apoiador explícito de Serra, faz coro com os que querem parar o Brasil. Em declaração à imprensa “[...] diz que esse ritmo de expansão é improvável num horizonte tão curto [sic; o horizonte é 2022] e, caso se confirme, pode gerar desequilíbros [...] Quem fez esse estudo estava no mundo da lua.”
Para os brasileiros, que estão com os pés na Terra e os olhos no futuro, não é nada difícil entender porque Serra não gosta da SAE.
Nenhum comentário:
Postar um comentário