Já passava das quatro da tarde, na quarta-feira 1º, quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso se deu conta de que estava prestes a perder o voo que o levaria para a Alemanha no início daquela noite. Correu até o escritório que mantém em seu amplo apartamento no bairro de Higienópolis, desligou o computador e colocou um moderno iPad numa pasta.
Naquele mesmo momento, tucanos de todas as plumagens alvoroçavam-se Brasil afora, revendo estratégias de uma campanha presidencial que eleva o tom a cada dia. No entanto, Fernando Henrique, o nome mais importante do partido, estava alheio a toda esta movimentação. Na verdade, estava pouco se importando com o que ocorria nos comitês eleitorais.
“Vou para a Alemanha participar de um encontro de líderes políticos europeus. Não vou ficar me acotovelando no meu partido”, disse o ex-presidente à IstoÉ pouco antes de sair de casa rumo ao aeroporto. Naquela tarde FHC abandonou a campanha à Presidência de seu ex-ministro da Saúde. Pode não ter sido definitivo, mas, sem dúvida, tratou-se de um abandono simbólico. O fato de o único ex-presidente tucano deixar a batalha eleitoral em sua reta final para tratar de assuntos particulares no Exterior expõe duas verdades inconvenientes ao PSDB.
A primeira é de que o partido desistiu de atrelar a imagem de Serra à de FHC, afastando da propaganda eleitoral sua mais graduada estrela. A segunda constatação é de que FHC está magoado com essa situação. “Ele diz que entende, mas não sei no seu íntimo o que se passa. Toda vez que tocamos nesse assunto ele se fechou, preferiu não entrar nessa conversa”, diz um dos assessores mais próximos do ex-presidente nos tempos de Planalto.
Nos bastidores do partido, porém, dois dias antes de embarcar para a Alemanha, FHC cedeu às mágoas que se acumulam desde a primeira campanha de José Serra à Presidência da República, em 2002. Diante de um grupo de deputados federais do PSDB e do DEM que, como ele, discordam dos rumos da campanha tucana, desabafou: “Estou muito magoado porque o país mudou em nosso governo e agora o Serra faz uma campanha escondendo que quem mudou o Brasil fomos nós.”
O grupo de parlamentares havia ido ao apartamento de Higienópolis tentar convencer FHC a exigir um papel mais ativo na disputa à Presidência. Queriam que ele colocasse na mesa sua estatura política e forçasse Serra a aceitar a estratégia de defender que seus oito anos de governo foram o alicerce para as conquistas do governo Lula.
Os pedidos foram em vão. “Não vou insistir”, disse Fernando Henrique, encerrando o assunto. “Não há mais espaço para discutir isso, ele está chateado”, admitiu um dos deputados presentes ao encontro.
Um dos principais líderes do PSDB paulista conta que o ponto crucial da irritação de FHC foi a posição dos marqueteiros da campanha de Serra que compararam sua popularidade decrescente no final do mandato aos altos índices de aprovação do presidente Lula, para concluírem que o uso de sua imagem tiraria votos de Serra.
À IstoÉ, FHC desdenhou este tipo de pesquisa. “Sempre depende de como elas são feitas”, comentou. Na verdade, até o momento o ex-presidente pediu votos apenas para dois candidatos ao Senado: Aloysio Nunes (PSDB),
No PSDB o tema FHC tornou-se tabu. São poucos os grão-tucanos que aceitam falar abertamente sobre seu abandono pelo partido. Uma das exceções é o senador Álvaro Dias, que chegou a ser o candidato a vice de Serra por algumas horas. “Fernando Henrique tem bons motivos para estar magoado, chateado e triste, mas sei que ele é superior a tudo isso”, afirmou.
Já nos partidos aliados o descontentamento sobre a forma de tratamento dado ao ex-presidente é mais explícito. “O Fernando Henrique tem razão para estar chateado. O governo dele simplesmente não foi citado na campanha de seu próprio partido”, diz o candidato ao Senado pelo DEM do Rio de Janeiro, Cesar Maia. O presidente do PTB, Roberto Jefferson, é mais enfático: “Infelizmente o Serra caiu nesse conto de que usar FHC seria ruim para a campanha. Errou feio.”
FHC volta da Alemanha na quarta-feira 8. Passa alguns dias
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