O Ali Kamel, diretor da Globo, levou uma sova no STF.  Por 10 x 0 (dez votos a zero), o tribunal decidiu que são constitucionais -  sim!!! – as cotas para negros nas universidades brasileiras.
  
  Por Rodrigo Vianna, em seu Blog
    
  Kamel, como se sabe, nega que haja racismo no Brasil. “Não somos  racistas” é o título de um livro dele. Kamel é contra as cotas. E não  está sozinho. Outros ideólogos contra as cotas são Demétrio Magnoli,  ex-trotskista hoje especializado em dizer o que a Globo gosta de ouvir, e  Demóstenes Torres, amigo de sala e cozinha de Carlinhos Cachoeira.
  
  Foi a terceira derrota acachapante sofrida por Ali Kamel em seis anos. Em 2006,  ele apostou tudo contra a reeleição de Lula. Eu trabalhava na Globo e vi de  perto todo o processo. A indignação seletiva nos telejornais, a forma como os  aloprados eram sempre caracterizados como “do PT”, enquanto os  tucanos eram tratados como “funcionários do governo anterior”, a  forma como se escondeu o que havia no famoso dossiê contra Serra que os  “aloprados” supostamente iriam comprar, a maneira como o  “dinheiro dos aloprados” foi parar no JN na antevéspera do primeiro  turno, a trama do delegado Bruno exposta pelo Azenha e depois pela  CartaCapital… Tudo isso é história – que um dia precisa ser contada  com mais detalhes.
  O bombardeio da Globo contra Lula começara antes, em 2005, na cobertura do  chamado Mensalão. O jornalista Marco Aurélio Mello escreveu um belo texto sobre  isso. A Globo queria “sangrar Lula”, para derrotá-lo nas urnas em  2006. Aliou-se até ao pequeno ACM Neto. Não deu. Ali Kamel perdeu feio. 
  
  Em 2010, Ali Kamel pôs a Globo contra Dilma. Quem não se lembra do episódio da  bolinha de papel? O perito Molina - que já atuara a favor de Kamel em causas  pessoais do diretor da Globo no Judiciário – foi usado no JN para criar a  teoria de que Serra fora atingido por um misterioso objeto. Só faltou acharem  um Lee Osvald! A Globo passou ridículo. Serra virou Rojas. E Ali Kamel perdeu  pela segunda vez.
  
  A terceira derrota veio agora, no STF. “Ninguém assistiu ao formidável  enterro de tua última quimera”. Ninguém encampou a tese kameliana de que  cotas seriam uma forma de “acirrar” as disputas raciais no Brasil.  Demóstenes (recolhido à cozinha de Cachoeira) fez falta, porque era valoroso  defensor dessa tese. Chegou a dizer, numa audiência pública, que o racismo não  fora tão violento assim, e que a mistura entre negros e brancos se deu através  de estupros cometidos pelos senhores, sim, mas que eram ”consentidos”  pelas escravas. Segundo ele, “uma história tão bonita de  miscigenação”. Essa é a turma contra as cotas.
  
  Ali Kamel é um pouco mais sutil. Mas também encampa teses estranhas: por  exemplo, relativiza a cor da pele como elemento definidor da Escravidão no Brasil.  Por que digo isso? Porque ele me falou sobre o tema numa troca de e-mails  pessoal, em 2005. Eu cobrira, pela Globo, a visita a São Paulo de um enviado  especial da ONU sobre racismo. A matéria não foi ao ar no JN. Kamel derrubou.  Escrevi a ele no Rio, para saber o que acontecera. Trocamos e-mails de forma  muito civilizada. E fiquei sabendo como ele pensava.
  
  Já falei sobre isso numa entrevista a Marcelo Salles, mas sempre evitei dar  detalhes dos e-mails, afinal a troca de mensagens se dera de forma reservada.  Só que Ali Kamel não se importou com isso: usou os e-mails num processo  judicial que move contra mim! Que deselegância! Usou para tentar provar que eu  o tratava muito bem, e que depois passei a criticá-lo.
  
  Sim, na troca de e-mails eu o tratei de forma cordial, como faço com todo  mundo. Não tenho nada, absolutamente nada, contra ele pessoalmente. Nossas  diferenças são políticas e jornalísticas, são formas diferentes de ver o mundo  e de intervir no debate.
  
  Desde o início do governo Lula, Ali Kamel se posicionou contra o Bolsa-Família  (“assistencialista”, o certo era investir em educação), contra o  Prouni, contra as cotas (afinal, se “não somos racistas”, pra que  cotas?).
  
  Por isso, essa terceira derrota de Ali Kamel, no STF, deve ter sido a mais  dolorosa. “Ninguém assistiu ao formidável enterro de tua última  quimera”. Não apareceu ninguém para defender a “sociologia  kameliana” no STF. Ele levou uma surra.
  
  Nos e-mails de 2005, com alguma arrogância, tentou ensinar-me quem era Gilberto  Freyre. Ali Kamel provavelmente acredite que é o novo Freyre, o novo formulador  da “democracia racial” brasileira. Um Freyre incompetente. Porque  mesmo entricheirado na emissora mais poderosa da América Latina, ele perde  todas. Perde o debate no STF, perde as eleições, perde a capacidade de influir  nas decisões do Estado brasileiro. Um bom sinal.
  
  Fonte: O Escrevinhador
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