por Osvaldo Bertolino*
Certas lideranças de esquerda deveriam revisitar a história para ver o que está por trás da manipulação do "mensalão" e das acusações contra o senador Renan Calheiros (PMBD-AL). Na verdade, o que está ocorrendo é mais um round da luta entre dois brasis que começou, a rigor, no começo dos anos 40.
Muita gente inocente está pagando um alto preço pelo uso que alguns petistas fizeram do esquema de corrupção criado pelos tucanos para financiar campanhas eleitorais. Isso se deve à inobservância por algumas lideranças de esquerda do que se pode chamar de pilares da nação brasileira. A cobertura do julgamento parcial - nos dois sentidos do termo - do "mensalão" pelo Superior Tribunal Federal (STF), no entanto, oferece mais uma oportunidade para se entender o que isso quer dizer na prática. O primeiro efeito é a contaminação do "caso Renan Calheiros" pela pirotecnia da mídia em torno do assunto.
Não há dúvida de que a "grande imprensa" agora põe a faca no pescoço do presidente do Senado para tentar conduzi-lo imobilizado ao matadouro. É uma tentativa de fazer uma ponte entre os dois casos e criar o chamado efeito dominó, até a faca chegar ao pescoço do presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva. Tradução simples e direita: para desgosto dos amantes da tranqüilidade, a disputa pelo poder no Brasil volta a ter intensidade crescente. O responsável por esta situação é o leve balanço na estrutura social brasileira provocado pelas ações sociais do governo Lula.
Véu das relações sociais obsoletas
Vivemos numa realidade tão complexa que a construção de uma simples rede de esgoto em alguma periferia ou de uma estrada asfaltada que rasga os sertões rompe ao mesmo tempo o véu das relações sociais obsoletas que temos no Brasil. E olha que são medidas meia-sola, que nem de longe ameaçam o satus quo. O problema é que o governo Lula se propõe a ir além e com essas pequenas ações sociais pode granjear apoio popular para temas como política externa independente, desenvolvimento econômico, planejamento, papel do Estado e integração progressista da América Latina - assuntos que pouco a pouco ganham espaços no panorama político e no debate ideológico.
Com estes dados, fica fácil entender por que o vazio de propostas da direita é preenchido com adjetivos fortes atribuídos aos envolvidos no "mensalão" e ao "caso Renan Calheiros" pelo julgamento paralelo dos justiceiros da "grande imprensa". No caso do "mensalão", o que mais se ouviu ou leu é que o STF tomou uma decisão histórica - com ênfase no "tó" - e que a transformação dos denunciados em réus - com ênfase no "ré" - mostra que as "instituições" funcionam. A verdade é que um mínimo de seriedade ao analisar o ocorrido revela que a Justiça é ágil em certos casos e cágada - a sílaba tônica fica a seu critério - em outros.
Se a coisa fosse para valer, a faca no pescoço de alguns ministros do STF deveria servir também para outros casos semelhantes ao do "mensalão" que abundam no país. Acusações como as atribuídas a Renan Calheiros, que são café pequeno perto do que se sabe de muitos parlamentares do campo conservador, deveriam ser examinadas com lupa de precisão. Mas, convenhamos, não se faz política com pé no peito e faca no pescoço. E muito menos justiça. O problema não está aí. Se estivesse, deveríamos proclamar: deixem os poderes da República trabalhar e noticiemos o que eles fazem. Os procuradores de escândalos e os promotores de injustiças não teriam vez. E aí sim teríamos toda razão do mundo para clamar por justiça para todos - independente da cor ideológica de cada um. Mas rigorosamente não é disso que se trata atualmente no Brasil.
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