quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Brasil de Fato: Quem tem medo d´antas?

Leia a íntegra do editorial do jornal Brasil de Fato, edição nº 288, de 02/09/2008, que aborda a denúncia de grampos no STF e no Senado:

"Quem tem medo d'antas?

Veja chegou ao limite da pusilanimidade. Não obstante, prosseguiu.

Só acredita que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) grampeou o telefonema entre o meritíssimo Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) quem é capaz de acreditar nas informações que a revista Veja veicula.

E só são capazes de acreditar em Veja seus pares da grande mídia comercial e outros elementos defensores de interesses e métodos tão espúrios quanto os dessa corporação. A bem da verdade, nem uns nem outros acreditam. Apenas fazem o mesmo jogo: confundir o público para, turvada a água, realizarem a pescaria.

Esses pescadores não são amadores e costumam ter pedigree - o senhor Daniel Dantas descende do barão de Jeremoabo, o maior latifundiário que este país conheceu. Ninguém ignora a relação promíscua entre o Barão Dantas e Veja - nem mesmo o meritíssimo Mendes.

Segundo as investigações do delegado Protógenes Queiroz, da Polícia Federal (PF) - o meritíssimo Mendes e o poder que preside não seriam empecilho para que o nobre de Jeremoabo atingisse seus objetivos e saísse ileso de qualquer investigação ou processo que chegasse no STF... Bem, é isto que está gravado da tentativa de suborno (de 1 milhão de dólares) oferecido pelo senhor Hugo Chicaroni a um delegado, em nome do senhor de Jeremoabo. Na conversa, o senhor Chicaroni é muito claro: "Ele [o senhor Dantas] se preocupa com hoje. Lá pra cima [instâncias superiores do Judiciário], o que vai acontecer, lá ele não tá nem aí. Por que ele resolve. STJ, STF... ele resolve".

Como age Veja

Há um ano, a Editora Abril, dona de Veja, instalou lobistas na Câmara Federal para tentar barrar a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigaria uma ilegalidade na venda da TVA - operadora de TV a cabo, pertencente ao Grupo Abril - para a transnacional espanhola Telefônica. Na ocasião, deputados foram abordados por representantes da Abril, e pressionados para retirar suas assinaturas do documento que propunha a instalação da CPI.

E, enquanto a Abril articula lobbies, a revista se capacita para realizar a sua parte: criar "fatos" e factóides. Sua redação (salvo honrosas exceções) abriga uma malta para ninguém botar defeito. Uma verdadeira equipe de criação: para que respeitar a objetividade factual, se podem criar uma realidade virtual que atenda melhor aos interesses do grande patrão Civita e permita, por isto mesmo, que algumas migalhas caiam em suas manjedouras?

Dessa arte da criação, faz parte saber escolher figuras capazes de legitimar e conferir foros de verdade aos jogos virtuais projetados pela equipe de "criação". Lembra o jornalista Cláudio González, que o senador Demóstenes Torres "tem servido de fonte para a Veja, sempre que a revista precisa dar substância a matérias inventadas, como foi o caso da matéria sobre a ajuda das Farc ao PT e a matéria sobre as supostas contas secretas no exterior, em nome do delegado Paulo Lacerda, diretor da Abin".

Conhecida como "viveiro de antas", a redação de Veja tem como um dos destaques do seu plantel de tapirídeos ungulados, o colunista Diogo Mainardi. Este acaba de ser condenado pela 13ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 3 meses e 15 dias de detenção, ou a uma multa de três salários-mínimos, e pagamento de 11 dias de multa.

O motivo da condenação foi um processo movido contra o artiodáctilo, pelo jornalista Paulo Henrique Amorim, acusado pelo senhor Mainardi (na edição de 06.09.2006), de usar dinheiro oriundo de fundos de pensão e empresas públicas, para manter sua página no iG, em sua "batalha comercial do lulismo contra Daniel Dantas".

Fechando o círculo

Despidos os personagens, desmontado o cenário, vai se consumando o enredo desse folhetim de quinta categoria. No entanto, sobra uma pergunta: e o delegado Paulo Lacerda, diretor da Abin e ex-PF?

Foi durante a gestão do delegado Lacerda frente à PF que tiveram início as investigações das atividades ilícitas do Barão D'antas e de sua quadrilha - a operação Satiagraha, tendo à frente o delegado Protógenes Queiróz. Enquanto doutor Lacerda esteve frente à PF, não apenas essas investigações foram incentivadas, como, sobretudo, foram criadas as condições de infra-estrutura e de pessoal para o trabalho do delegado Protógenes.

Em agosto de 2007, no entanto, o doutor Lacerda foi transferido para a Abin, e a partir desse momento a Satiagraha deixa de ser prioridade para o novo diretor, doutor Luiz Fernando Corrêa, que reduz drasticamente a estrutura da Operação. No entanto, nos limites da lei, o doutor Lacerda esteve sempre ao lado do delegado Protógenes. Chamado a esclarecer, perante a CPI das Escutas Telefônicas, fatos relacionados à Satiagraha, o doutor Lacerda, sem meias palavras, fez uma verdadeira radiografia da revista Veja, bem como dos negócios e modus operandi do senhor de Jeremoabo.

Depois de derrubado o delegado Protógenes (afastado do cargo), a bola da vez desse poder supra-Estado capitaneado pelo Baronete baiano seria o doutor Paulo Lacerda.

A pronta reação do Planalto

Desta vez, porém, a uma primeira vista, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva parece ter acertado o alvo e quebrado as pernas dos seus adversários: DE IMEDIATO, afastou PROVISORIAMENTE o delegado Paulo Lacerda e toda a cúpula da Abin, para que as investigações possam correr com transparência - para usar suas palavras.

A RAPIDEZ da medida, evita o desgaste de uma nova e arrastada crise institucional, como conseguiu Veja em outros momentos, sobretudo eleitorais. Ao mesmo tempo, preserva a direção da Abin do desgaste de um longo processo. Já sua PROVISORIEDADE, além de igualmente preservar a equipe da Abin, a prestigia e sinaliza com sua volta.

Ou seja, há indicadores de que a tentativa golpista de Veja-Jeremoabo, desta vez, tende a dar com os burros (e antas, por que não?) n'água."

Brasil de Fato

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