segunda-feira, 15 de setembro de 2008

GRAMPOS



Espionagem ao alcance de qualquer um


Métodos e equipamentos de arapongagem podem ser comprados via internet
Fábio Fabrini

Juarez Rodrigues/EM/D.A Press

Com auxílio de técnicos e equipamentos a preços acessíveis, empresas e detetives particulares se oferecem para fazer serviço de escutas telefônicas sem autorização judicial


Quem poderia grampear o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes? Em tese, qualquer um. Bastam um cartão de crédito e dois ou três dias de paciência. Espionar no Brasil é uma questão de tempo e dinheiro. Um imenso cardápio de métodos e equipamentos de arapongagem, antes de acesso restrito, está ao alcance de qualquer mortal na internet. É possível encomendar equipamentos de escuta, disfarçados dos mais prosaicos objetos; microcâmeras com lentes milimétricas; e até mesmo aprender a construir a famosa maleta de grampo, que teria sido comprada pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Se é de assustar que nem o alto escalão do Judiciário escape, igualmente escandalosa é a forma como vários dispositivos de bisbilhotagem são, cada vez mais, de domínio público.

O vasto mercado é alimentado por fabricantes de várias partes do mundo, especialmente a China, o Japão, os tigres asiáticos e os Estados Unidos, que têm tradição na produção de softwares e equipamentos eletrônicos. A maioria dos sites é mantida por escritórios fora do Brasil, mas, nos últimos anos, alguns vêm se instalando por aqui. Há cinco anos, um deles, de origem argentina, aportou em São Paulo e oferece a policiais, detetives particulares e figurões de diversas áreas soluções para qualquer curiosidade.

“Os empresários são o maior cliente. Hoje em dia, o acesso à informação privilegiada, o mais rápido possível, vale mais do que dinheiro”, afirma um representante da empresa, que pede discrição, justificando que a popularização do arsenal tem uma vantagem, mas também um revés: vende-se mais, mas, quanto mais conhecidos, maior é a possibilidade de os produtos perderem o status de especiais: “É isso o que dá valor a eles. Não dá para todo mundo ser espião”.

ARTEFATOS Câmeras escondidas em bonés, maços de cigarro, bolsas, botões de camisa, agendas e fichários custam a partir de R$ 5,3 mil. Para gravar conversas, basta afivelar um relógio de pulso ou prender uma caneta no bolso. Em geral, os equipamentos transmitem imagem e som por freqüência de rádio ou celular. A indústria bélica contribui com alguns objetos, como o binóculo capaz de perceber a aproximação de uma pessoa no mais completo breu. A vedete é um telefone que capta o áudio e o remete para qualquer parte do mundo. O site português seduz: “Deixe este telemóvel no lugar que deseja vigiar (quarto, gaveta, carro...) e ouça todas as conversas, a qualquer momento”.

A página avisa que a maleta mais comentada dos últimos dias, capaz de interceptar ligações de celular, só pode ser vendida a órgãos de investigação. Nada que, a um clique, não se resolva. Basta migrar para um site norte-americano e lá está ela, sem restrições. Em geral fabricadas na Índia, China ou Rússia, as maletas são equipadas com uma antena e um receptor, que captam sinais de celulares num raio de 100 metros. Um software, instalado num notebook, identifica o número desejado e decodifica a mensagem, transformando-a em som.

“Em Brasília, uma cidade muito aberta, é possível grampear conversas a uma distância muito maior. Quanto mais ligações o equipamento intercepta, mais caro ele é, podendo chegar a R$ 500 mil. Os russos já vêm com mecanismos para quebrar sistemas anti-grampo”, comenta o físico César Bremer Pinheiro, especialista em segurança contra espionagem.

Para quem precisa economizar, a internet também dá, em comunidades de hackers, a receita de como fazer as maletas. Num dos sites, em inglês, é possível baixar o software, além de ler o projeto para a construção do aparelho. Em outro, também em inglês, encomenda-se o material por menos de US$ 1 mil. “Um leigo não faz, mas um técnico em eletrônica segue as instruções com muita facilidade”, afirma Bremer. Há ainda página que ensina a montar um equipamento de escuta a laser. “É próprio para ouvir conversas em ambientes envidraçados, a distância”, esclarece.

PRIVACIDADE O artigo 5º da Constituição garante ao cidadão brasileiro o direito à privacidade. Porém, alguns tipos de bisbilhotagem estão previstos na legislação, o que abre caminho para o imenso comércio da espionagem. A Lei Federal 9.296, de 1996, proíbe as interceptações telefônicas, salvo as praticadas por órgãos oficiais de investigação, com autorização judicial. Em outros casos, a punição depende da finalidade do araponga. Exemplo: se o objetivo de uma escuta em ambiente fechado é fazer espionagem industrial, o delito é divulgação de segredo profissional. A pena é de, no máximo, seis meses de detenção e pode ser convertida em prestação de serviços.

GRAMPO NO GRAMPO

Negociação gravada

Estado de Minas: Boa tarde. Estou precisando de um serviço de investigação. (…)Estou querendo um serviço de escuta.

Detetive 1:


Em carro, casa, telefone?

Celular.
Quanto tempo?

Uma semana, pelo menos.


Qual é o seu preço?
(…) Posso fazer isso a R$ 3 mil.

Você grava 24 horas?
Geralmente, é o período de 24 horas. Pode deixar o equipamento ligado direto.

Como você grava isso?
Através de um software, na companhia telefônica.

Você tem um contato lá…
Tenho contato em várias operadoras.

Como é o pagamento?
É no início do trabalho, porque eu tenho que acertar com o rapaz para ele poder programar essa plataforma e poder começar.

É seguro, não tem risco de dar problema para a gente?


Não, por isso eu faço na operadora. Esse camarada… trabalha no setor de manutenção. Ele entra em qualquer linha, na hora em que precisar. Instala o software e começa a gravar.



Araponga particular na escuta

Domínio popular

Antídoto à venda na rede

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