Nenhuma linha a respeito de que a última redução da jornada ocorreu em 1988 e que, de lá para cá, houve um crescimento exponencial da produtividade, superior a 150%. O dado desprezado desnuda justamente o grau de exploração a que o trabalhador foi submetido pelo capital, particularmente durante o período neoliberal. Tais índices são valores,
cifrões, devidamente apropriados pelas empresas, que não foram repassados para a força de trabalho.
Logo depois, a Folha busca rebater o estudo técnico do Dieese que aponta a necessidade da redução da jornada e da valorização da hora extra, pois possibilitam a criação de 2,2 milhões de empregos. "Tal suposição é equivocada. Se for aprovada, a proposta tende a elevar a informalidade e o desemprego justamente nos setores menos protegidos por sindicatos e pela fiscalização oficial", alerta o editorial. E acrescenta: "isso porque encarece o custo do trabalho, já onerado pela alta carga tributária sobre a folha de salários. Além disso, é mais um estímulo para que as empresas substituam trabalhadores por máquinas e aumentem o chamado desemprego estrutural".
Como o próprio Dieese já demonstrou, o impacto na folha de pagamento seria de cerca de 2%, absorvido em, no máximo, seis meses pelos impactos positivos da medida para o conjunto da economia. A respeito dos setores menos protegidos, que tal a Folha dedicar um centésimo do espaço em que veicula grandes empreendimentos imobiliários para ajudar no combate à informalidade no setor da construção civil, que beira os 70%? Quanto à substituição de trabalhadores por máquinas, a elevação do custo é tão risível quanto a tolice do argumento.
O editorial nos lembra ainda que "nos setores em que o avanço é economicamente possível, jornadas de 40 horas semanais já são contempladas por acordos ou convenções coletivas acordados livremente por patrões e empregados. Para esses segmentos, a emenda seria inócua". Outra tentativa de enganação já que, todos sabemos, o avanço dos acordos, bem como da legislação, é fruto da pressão crescente e constante, essencial para melhorar o patamar da reivindicação. Da mesma forma que vem ocorrendo com os pisos das categorias a partir da política de valorização do salário mínimo. Ela não torna o piso "inócuo", ela possibilita e impulsiona o seu aumento.
A publicação diz também que a proposta "se revela inoportuna em tempos de crise", cita a França, "onde a jornada de trabalho é de 35 horas semanais" e discute-se "exatamente a flexibilização das leis trabalhistas para atrair investimentos". Nada mais lógico: a Folha apostou durante o desgoverno FHC na submissão do país ao receituário neoliberal de privatização/desnacionalização, arrocho e precarização de direitos, o que acabou se transformando num círculo vicioso em favor do capital especulativo, das transnacionais e dos grandes monopólios privados. Ao contrário, nós lutamos por um círculo virtuoso, com o mercado interno sendo fortalecido, com as empresas nacionais sendo priorizadas: mais emprego, mais renda, mais consumo...
Empregos, nos ensina a Folha, "dependem justamente de investimentos e de uma boa educação". Nenhuma palavra sobre o apoio do jornal à desnacionalização do parque produtivo nacional nem sobre o desmantelamento das universidades públicas durante o período FHC.
O editorial termina alertando que "sozinhas, leis não criam postos de trabalho". A Folha não diz abertamente, mas induz a pensarmos que talvez seria melhor que os demotucanos retornassem. Afinal, se sós as leis não conseguem, que tal mal acompanhadas?
Haja paciência para tamanha incompetência.
Escrito por Quintino Severo, secretário geral da CUT Nacional
Nenhum comentário:
Postar um comentário