segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Folha ataca Dilma: a vingança póstuma de Otavio Frias de Oliveira

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O homem fardado e a declaração na foto acima correspondem a Otávio Frias de Oliveira, o falecido fundador do jornal Folha de S.Paulo. Imagem e palavras pertencem a momentos distintos de sua vida. Todavia, unidas explicam por que seu herdeiro Otavio Frias Filho, o “Otavinho”, foi resgatar em arquivos dos órgãos de repressão da ditadura militar as desculpas usadas por esta para prender e torturar Dilma Vana Rousseff, a presidente eleita do Brasil.

Por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania

Frias de Oliveira lutou na Revolução Constitucionalista de 1932, que tentou dar um golpe de Estado contra Getúlio Vargas. Coerente com seu apreço pelo militarismo e pela derrubada de governos dos quais não gostava, apoiou o golpe militar de 1964. Nesse período, a Folha de São Paulo serviu de voz e pernas para os ditadores que se sucederiam no poder ao exaltá-los e ao transportar para eles seus presos políticos até os centros de tortura do regime.

No dia 21 de setembro de 1971, a Ação Libertadora Nacional (ALN) incendiou camionetes da Folha que eram utilizadas para entregar jornais. Os responsáveis acusavam o dono do jornal de emprestar os veículos para transporte de presos políticos. Frias de Oliveira respondeu ao atentado publicando um editorial na primeira página no dia seguinte, sob o título “Banditismo”.

Eis um trecho do texto:

“Os ataques do terrorismo não alterarão a nossa linha de conduta. Como o pior cego é o que não quer ver, o pior do terrorismo é não compreender que no Brasil não há lugar para ele. Nunca houve. E de maneira especial não há hoje, quando um governo sério, responsável, respeitável e com indiscutível apoio popular está levando o Brasil pelos seguros caminhos do desenvolvimento com justiça social-realidade que nenhum brasileiro lúcido pode negar, e que o mundo todo reconhece e proclama. [...] Um país, enfim, de onde a subversão -que se alimenta do ódio e cultiva a violência – está sendo definitivamente erradicada, com o decidido apoio do povo e da imprensa, que reflete os sentimentos deste. Essa mesma imprensa que os remanescentes do terror querem golpear.”
(Editorial: Banditismo – publicado em 22 de setembro de 1971; Octavio Frias de Oliveira).  


O presidente da República de então era Emílio Garrastazu Médici. Nomeado presidente pelos militares, comandou o período mais duro da ditadura militar. Foi a época do auge das prisões, torturas e assassinatos de militantes políticos de esquerda pelo regime.

Apesar dos elogios de Frias de Oliveira à ditadura, segundo a Fundação Getúlio Vargas foi no governo Médici que a miséria e a concentração de renda ganharam impulso. O Brasil teve o 9º Produto Nacional Bruto do mundo no período, mas em desnutrição perdia apenas para Índia, Indonésia, Bangladesh, Paquistão e Filipinas.

O uso político que o jornal Folha de S.Paulo começou a fazer neste sábado das desculpas da ditadura para prender e torturar impiedosamente uma garota de 19 anos que lutava para libertar seu país do regime de exceção constitui-se, portanto, em uma vingança póstuma de um homem que dedicou sua vida a uma luta incessante contra a democracia, obviamente por acreditar que o povo não sabia votar.

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Folha de São Paulo

20/11/2010

Dilma tinha código de acesso a arsenal usado por guerrilha

Revelação foi feita em 1970 sob tortura por ex-colega da petista na luta armada e confirmada por ele em entrevista
Grupo VAR-Palmares guardava em imóvel 58 fuzis e 4 metralhadoras; armamento foi roubado de batalhão do ABC

MATHEUS LEITÃO
LUCAS FERRAZ
DE BRASÍLIA

A presidente eleita, Dilma Rousseff, zelava, junto com outros dois militantes, pelo arsenal da VAR-Palmares, organização que combateu a ditadura militar (1964-1985).
Entre os armamentos, havia 58 fuzis Mauser, 4 metralhadoras Ina, 2 revólveres, 3 carabinas, 3 latas de pólvora, 10 bombas de efeito moral, 100 gramas de clorofórmio, 1 rojão de fabricação caseira, 4 latas de “dinamite granulada” e 30 frascos com substâncias para “confecção de matérias explosivas”, como ácido nítrico. Além de caixas com centenas de munições.

A descrição consta do processo que a ditadura abriu contra Dilma e seus colegas nos anos 70. A Folha teve acesso a uma cópia do documento. Com tarja de “reservado”, até anteontem ele estava trancado nos cofres do Superior Tribunal Militar.

Trata-se de depoimento dado em março de 1970 por João Batista de Sousa, militante do mesmo grupo de guerrilha do qual Dilma foi dirigente.

Sob tortura, ele revelou detalhes do arsenal reunido para combater a repressão e disse que Dilma tinha recebido a senha para acessá-lo.

Quarenta anos depois, Sousa confirmou à Folha o que havia dito aos policiais -e deu mais detalhes.

Dilma já havia admitido, em entrevista à Folha em fevereiro, que na juventude fez treinamento com armas de fogo. O documento do STM, porém, é a primeira peça que a vincula diretamente à ação armada durante a ditadura.

Procurada pela Folha, a presidente eleita não quis falar sobre o assunto.
O armamento foi roubado do 10º Batalhão da Força Pública do Estado de São Paulo em São Caetano do Sul (SP), de acordo com o DOPS (Departamento de Ordem Política e Social).

A ação ocorreu em junho de 1969, mês em que as organizações VPR e Colina se fundiram na VAR-Palmares.

Sousa disse que foi responsável por guardar o arsenal após a fusão. Com medo de ser preso, fez um “código” com o endereço do “aparelho” -como eram chamados os apartamentos onde militantes se escondiam.

Para sua própria segurança e do arsenal, Sousa dividiu o endereço do “aparelho” em Santo André (SP) em duas partes.

Assim, só duas pessoas juntas poderiam saber onde estavam as armas. Uma parte da informação foi entregue a Dilma, codinome “Luisa”. A outra, passada a Antonio Carlos Melo Pereira, guerrilheiro anistiado pelo governo depois de morrer.

O documento registra assim a informação: “Que, tal código, entregou a “Tadeu” e “Luisa”, sendo que deu a cada um uma parte e apenas a junção das duas partes é que poderia o mencionado código ser decifrado”.

“Fiz isso para que Dilma, minha chefe na VAR, pudesse encontrar as armas”, diz, hoje, Sousa.

Tido pelos colegas como um dos mais corajosos da VAR-Palmares, Sousa afirma ter sido torturado por mais de 20 dias. Ficou quatro anos preso e, hoje, pede indenização ao governo federal.

Aposentado, depois de trabalhar como relações públicas e com assistência técnica para carros no interior de São Paulo, ele diz ter votado em Dilma. Na entrevista, chamou a presidente eleita de “minha coordenadora”.

“PONTOS”

Sousa contou que tinha três “pontos” -como eram chamados os locais e horas de encontro na clandestinidade- com Dilma nos dias seguintes à sua prisão. Mas disse que não entregou as datas e endereços durante as sessões de tortura -inclusive com choques elétricos na “cadeira do dragão”.

Sousa participou de operações armadas, como assaltos a bancos e mercados. “Informava todas as ações para Dilma com três dias de antecedência”, declarou.

Com a “dinamite granulada”, por exemplo, ele afirma ter feito bombas com canos de água “cortados no tamanho de quatro polegadas, com pregos dentro”.

Quando 18 militares à paisana cercaram seu “aparelho”, Sousa os recebeu com rajadas de metralhadoras e com as bombas caseiras. Um militar ficou ferido.
Os agentes conseguiram uma trégua após duas horas de intenso tiroteio.

Sousa diz que, meses depois, Dilma contou a ele que, quando ele não apareceu nos encontros previstos, ela usou o código para pegar o arsenal: Dilma e Melo encontraram a casa perfurada de balas e a rua semelhante a uma trincheira de guerra, com enormes buracos.

O depoimento registra 13 bombas jogadas contra os militares. Com um vizinho, Dilma e Melo descobriram que o companheiro esquerdista havia sido levado vivo pela repressão.

 

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