Veto de Serra a projeto sobre áreas de risco pode ser derrubado
Deputados estaduais de São Paulo articulam a derrubada do veto do governador José Serra (PSDB-SP) a projeto de lei que prevê o mapeamento de áreas de risco. Aprovado em 2008 por unanimidade, o texto da deputada Ana do Carmo (PT) dispõe sobre as medidas a serem tomadas para evitar tragédias em regiões sujeitas a inundações, deslizamentos e acidentes tecnológicos, como vazamentos e explosões.
Só na capital do estado, há pelo menos 105 mil moradias em áreas de risco, segundo levantamento divulgado na segunda-feira (21) pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT).
A autora da proposta acredita que os recentes acontecimentos
O consultor ambiental e geógrafo Márcio Ackermann, um dos idealizadores do PL 213, acredita que, caso o Executivo não tivesse vetado o texto, seriam evitados problemas como os vistos em 2010
O texto de Ana do Carmo prevê que o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), autarquia estadual dotada de algumas das mais avançadas técnicas de mapeamento de áreas de risco, faça o levantamento nos municípios em que se mostre necessário o trabalho. Uma vez feito o mapeamento, município e governo estadual deveriam planejar obras que eliminassem a possibilidade de deslizamento ou inundação. Em casos extremos, seria necessário proceder à demolição de moradias, desde que os moradores fossem incluídos em programas de reassentamento habitacional.
Eduardo Soares de Macedo, geólogo do IPT, aponta que o mapeamento das áreas de risco de uma cidade é fundamental para delinear as políticas públicas a partir de fatores como solo, vegetação, inclinação do terreno e pluviosidade. Santos e Belo Horizonte, indica Macedo, têm trabalhos antigos que surtiram efeito positivo na redução de acidentes do tipo. No fim do ano passado, o IPT concluiu o mapeamento da cidade de São Paulo, que mostra que há 134 mil famílias vivendo em 407 áreas de risco. “É importante porque o mapeamento parte de uma questão filosófica, que é conhecer o problema. Precisa saber qual problema tem na mão para propor soluções. Não tem saída para isso.”
Executivo ou Legislativo
Exatamente pela importância do assunto, o projeto passou sem qualquer dificuldade pelas comissões e pelo plenário. Recebeu pareceres positivos quanto à constitucionalidade, à execução orçamentária e à importância ambiental. Neste último caso, a Comissão de Defesa do Meio Ambiente designou como relator o deputado Vinícius Camarinha (PSB), que anotou que o projeto tinha relevância não apenas por garantir a segurança de habitantes de assentamentos irregulares, “mas também proteger áreas de preservação permanente e de proteção de mananciais.”
O parlamentar é um dos que continuarão na Assembleia na próxima legislatura. Em conversa com a Rede Brasil Atual, ele relembra que a necessidade de proteger áreas de risco era consenso entre os colegas durante a aprovação do projeto e que o veto de Serra em maio de 2008 fugiu ao programado. “Não entendi. Não esperava que fosse vetar. Foi uma surpresa.”
Em sua argumentação, o ex-governador apresenta como motivos para barrar o texto inconstitucionalidade, incompatibilidade financeira e problemas técnicos. O tucano despende nada menos que cinco parágrafos para dizer que o Legislativo não deve tratar de “temas administrativos” do Executivo.
“A decisão sobre adotar, e em que momento, medidas dessa espécie é reservada ao Chefe do Poder Executivo, como corolário do exercício da competência que lhe é deferida pela ordem constitucional”, defende Serra, que acrescenta haver uma indefinição quanto às partes envolvidas nos trabalhos e um significativo volume de recursos envolvidos. Por fim, ele relata que as secretarias de Meio Ambiente, Habitação e Saneamento e Energia se colocaram contra o projeto após análise técnica.
“Relevante e interessante”
A argumentação levanta dúvidas, especialmente em relação à pasta de Meio Ambiente, então comandada por Xico Graziano. Em artigo para o jornal O Estado de S. Paulo publicado em janeiro deste ano, o ex-secretário defendeu que apenas o trabalho de prevenção evitará a repetição das tragédias vistas neste começo de ano. “Uma lei, urgente, deveria obrigar os municípios a realizar o plano decenal, a favor da ocupação ordenada do seu território.”
Procurado, para confirmar se havia dado parecer desfavorável ao PL 213, como expõe o veto de Serra, Graziano preferiu que as perguntas fossem encaminhadas por email. Em sua resposta, pontuou que o assunto é “relevante e interessante. Mas eu não gostaria agora de entrar muito nessa matéria por envolver questões políticas.”
Quando foi encaminhado de volta à Assembleia Legislativa, o projeto ganhou como relator o então deputado Mário Reali (PT), atualmente prefeito de Diadema e eleito no início do ano presidente do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC. Em seu relatório, Reali discordava da análise de Serra de que o legislador não pode dispor sobre esse tipo de matéria e acrescentava que o texto não cria novas despesas, já que há vários programas da Administração Pública Estadual relativos a esse tipo de problema previstos no Orçamento anual.
Ana do Carmo lembra ainda que não há qualquer dúvida quanto aos responsáveis por cada parte do trabalho, já que o projeto cita claramente a Secretaria Estadual de Desenvolvimento e o IPT como coordenadores do mapeamento das áreas de risco. “Não tem argumentação nenhuma. Vetou simplesmente por vetar, e o pior é que não colocou nenhuma proposta no lugar”.
“Esse projeto não é inconstitucional. O Legislativo pode atuar nessa área oferecendo levantamento sobre áreas de risco. O projeto não fala onde é a área de risco, mas que as áreas devem ser mapeadas”, acrescenta o deputado Camarinha.
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