segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Advogado de Dirceu diz que defesa está baseada na Constituição

O julgamento do mensalão, no Supremo Tribunal Federal (STF), entra nesta segunda-feira (6) na fase da defesa dos réus. Os advogados terão até uma hora para defender seus clientes.


Nesta segunda apresentam as defesas os advogados de José Dirceu, ex-ministro e ex-deputado, José Genoino, atualmente assessor do Ministério da Defesa, Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, e do empresário Marcos Valério e de Ramon Hollerbach Cardoso, sócio do empresário Marcos Valério.

A previsão inicial era que essa fase da defesa tivesse começado na sexta-feira (3). Dirceu será defendido por José Luis Oliveira Lima, Genoino por Luiz Fernando Pacheco, Delúbio por Arnaldo Malheiros Filho, Marcos Valério por Marcelo Leonardo e Ramon Hollerbach por Hermes Guerrero.. O advogado do ex-ministro da Casa Civil antecipou que a base de sua argumentação será a ausência de provas para acusar Dirceu.

O ex-ministro, José Genoino e Delúbio Soares respondem aos crimes de corrupção ativa e formação de quadrilha. O empresário Marcos Valério e o sócio dele respondem por corrupção ativa, formação de quadrilha, peculato, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.

Os ministros do STF se esforçam para que o processo seja julgado por todos, uma vez que em setembro o ministro Cezar Peluso completa 70 anos e se aposenta da magistratura. Os advogados deverão apresentar seus argumentos até meados do mês.

Na sexta-feira, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, concluiu a sustentação oral pedindo a condenação de 36 dos 38 réus. O ex-ministro da Comunicação Social da Presidência da República Luiz Gushiken e o assessor do PL (atual PR) Antonio Lamas foram excluídos da condenação por falta de provas.

Provas contestadas

Os advogados de defesa contestaram neste domingo (5) que algumas provas mencionadas por Gurgel foram colhidas antes da abertura do processo criminal, mas não foram usadas nas alegações da Procuradoria no decorrer do processo penal no STF — como não foram confrontadas, não podem ter grande peso, dizem.

Os advogados de Dirceu, Delúbio e Genoino disseram que provas citadas pelo procurador-geral "ficaram restritas" à fase pré-processual — o inquérito da Polícia Federal e as investigações da CPI dos Correios.

"O tribunal não pode basear condenação em prova que não seja colhida sob contraditório. Inquérito serve para viabilizar o oferecimento da denúncia, não o julgamento", disse o defensor de Delúbio, Arnaldo Malheiros Filho.

Defesa baseada na Constituição

Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, advogado de José Dirceu, José Luis Oliveira Lima, disse que não há provas nos autos para a condenação de seu cliente. Leia abaixo trechos da entrevista:

Folha: Em sua sustentação oral, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, chamou José Dirceu de "autor intelectual" e "principal figura" do mensalão. Como o sr. responde a essas acusações?
José Luis Oliveira Lima: A defesa responde com as provas dos autos, produzidas durante o contraditório. Minha defesa se baseia no processo e na Constituição, e não em Chico Buarque.

São centenas de depoimentos que afastam taxativamente a acusação da Procuradoria-Geral da República e demonstram a inocência do ex-ministro José Dirceu.

É importante ressaltar que, após cinco anos da Ação Penal 470 [como o processo do mensalão é conhecido no STF], a Procuradoria não foi capaz de apontar nenhuma prova contra ele e admitiu isso ao sustentar sua tese com menção a pouquíssimos testemunhos indiretos ou colhidos na fase extrajudicial.

Folha: O que o sr. acha da tese, defendida por ele, de que o autor intelectual de um crime dificilmente deixa provas materiais e, nesses casos, valem as provas testemunhais?
José Luis Oliveira Lima: O único ponto em que a defesa concorda com a Procuradoria é a sua afirmação que a prova consistente da Ação Penal 470 é a testemunhal. E, nesse sentido, todas inocentam José Dirceu.

Folha: O procurador-geral não utilizou nenhuma prova da ação penal, desprezou o devido processo legal. Preferiu o "ouvir dizer".
José Luis Oliveira Lima: É gravíssima a tese da Procuradoria de condenar sem provas, agredindo a nossa Constituição Federal.

Folha: O sr. avalia que, ao evocar o domínio do fato sobre o das provas materiais, o procurador-geral faz uma acusação mais política do que técnica?
José Luis Oliveira Lima: Na nossa análise, toda a argumentação da Procuradoria no tocante a Dirceu é desprovida de provas técnicas. O Ministério Público Federal fechou os olhos para as provas e chega à Suprema Corte do país reconhecendo a sua ausência absoluta.

Folha: Há chance de o STF, com sua composição atual e dada a repercussão do caso, optar por um julgamento exemplar, acatando os argumentos do Ministério Público?
José Luis Oliveira Lima: O julgamento exemplar pressupõe um julgamento justo, realizado de maneira técnica, com base nas provas dos autos que foram produzidas com a presença das partes: acusação e defesa. E nesse caso, no nosso entender, a absolvição é a única solução.

Folha: Roberto Gurgel terminou sua sustentação pedindo a expedição imediata de mandados de prisão contra 36 réus. Teme que Dirceu seja preso?
José Luis Oliveira Lima: Essa hipótese jamais passou pela análise da defesa. José Dirceu é inocente e isto está fartamente provado.

Folha: Para que a tese do "mensalão" prevaleça, avaliam advogados e ministros, é forçoso que haja o elo do governo, representado por José Dirceu. Isso agrava a situação do seu cliente?
José Luis Oliveira Lima: Tenho certeza que o Supremo Tribunal Federal não julga sobre teses, mas sim para que a verdade das provas seja revelada.

Folha: Nas suas alegações finais, o sr. sustenta que, se houve malfeitos no PT, são da responsabilidade de Delúbio Soares. A estratégia é que o ex-tesoureiro assuma toda a culpa?
José Luis Oliveira Lima: O que sustentamos em nossa defesa, com base em dezenas de testemunhos que foram prestados com o compromisso de dizer a verdade, e que jamais foram contraditados pela acusação, é que José Dirceu, enquanto esteve na Chefia da Casa Civil, deixou de exercer qualquer influência nas decisões da Executiva Nacional e na vida do partido, inclusive na administração e nas finanças.

Folha: Vários depoentes, como o ex-tesoureiro do PTB Emerson Palmieri, dizem que ninguém no PT decidia nada sem consultar Dirceu. Como o sr. vê essas afirmações?
José Luis Oliveira Lima: Não é verdade que existem vários depoimentos, tanto que nenhum deles foi mencionado pelo procurador-geral em sua fala. Pelo contrário. Durante o processo, Palmieri desmentiu essa afirmação, assumindo que nunca conversou ou mesmo viu pessoalmente José Dirceu.

É inegável que o ex-ministro tinha influência política no governo, o que não significa nenhuma ilegalidade.

Folha: O procurador aponta a influência de Dirceu em todos os núcleos do mensalão. Como o sr. responde a isso?
José Luis Oliveira Lima: Com que prova a Procuradoria faz essa afirmação? Nenhuma. Nós estamos em um julgamento perante o STF, um julgamento técnico. Qual a prova que corrobora essa colocação? Repito: nenhuma.

Folha: Em sua defesa, Dirceu não nega ter recebido Marcos Valério na Casa Civil. Houve quantos encontros, para tratar de quê?
José Luis Oliveira Lima: O ex-ministro não recebeu Marcos Valério, mas em apenas duas oportunidades recebeu presidentes de empresas a que Marcos Valério prestava serviços, o que é bem diferente. Aliás, essa é uma prática comum. Quando a Folha recebe um empresário para um almoço, ele não vem acompanhado de seus assessores?

Importante lembrar que é função do ministro-chefe da Casa Civil se reunir com empresários e banqueiros. Havia até um setor próprio para isso, a sala de investimentos.

Folha: A ex-mulher de Dirceu, Angela Saragoza, obteve empréstimo e emprego no BMG e vendeu um apartamento para Rogério Tolentino, sócio de Marcos Valério e também réu. É só coincidência?
José Luis Oliveira Lima: Todas as testemunhas que foram ouvidas na Ação Penal 470 -e, ao contrário do Ministério Público, nós arrolamos testemunhas presenciais- negaram categoricamente que José Dirceu tivesse conhecimento desses fatos.

Folha: Se o mensalão não existiu, a que o sr. atribui o repasse de recursos para parlamentares?
José Luis Oliveira Lima: Não é a defesa que diz que o mensalão não existiu, são as provas dos autos. Os recursos foram entregues a parlamentares com um único fim: pagar dívidas de campanhas.

Folha: Cabe recurso em caso de condenação? Dirceu falou em recorrer a cortes internacionais.
José Luis Oliveira Lima: Tenho convicção da absolvição, não analisamos nenhuma outra hipótese.

Folha: O sr. tinha pronto recurso contra eventual tentativa de impedir o ministro Dias Toffoli de votar. Por que o voto dele é tão importante para a defesa?
José Luis Oliveira Lima: A defesa não tinha questionamento sobre pedido de afastamento do ministro Toffoli. Os votos de todos os ministros são importantes.

Folha: O fato de Toffoli ter sido advogado do PT e subordinado de Dirceu na Casa Civil não o torna suspeito para julgá-lo?
José Luis Oliveira Lima: Essa questão está superada e não cabe à defesa qualquer manifestação nesse sentido.

Folha: Como o sr. vê o clima acirrado entre ministros nas primeiras sessões do julgamento?
José Luis Oliveira Lima: O Supremo tem a sua dinâmica e os ministros são o quadro mais elevado da magistratura brasileira. Nosso papel perante a corte é apenas o de apresentar a defesa, mencionando as provas produzidas que demonstram a inocência de José Dirceu.

Folha: O sr. questiona a legitimidade de um eventual voto adiantado do ministro Cezar Peluso, que vai se aposentar? Por quê?
José Luis Oliveira Lima: O ministro Peluso é um dos mais experientes magistrados do país. Foi juiz de carreira, desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, é um legalista. O voto dele engrandecerá o julgamento.

Folha: Como o sr. avalia a condução do processo pelo relator, ministro Joaquim Barbosa?
José Luis Oliveira Lima: Muito correta, não houve nenhum problema com o ministro ao longo dos cinco anos da Ação Penal 470.

Folha: Qual a importância desse caso para a sua carreira, já que o sr. é um advogado relativamente jovem e em ascensão?
José Luis Oliveira Lima: É lógico que esse julgamento traz um grande aprendizado para qualquer advogado, a convivência com os colegas mais experientes é muito rica, bem como ouvir as colocações do Ministério Público e dos magistrados mais competentes do país. É um momento único para a carreira de qualquer profissional.

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