quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

O tórax de ACM Neto


A família de ACM Neto sustentou, durante 30 anos, uma das mais furiosas oligarquias encravadas no Nordeste, tão poderosa e despótica que rendeu a seu avô, finalmente derrotado, o apelido de Toninho Malvadeza.

Na semana retrasada uma, entre os milhões de brasileiros enlouquecidos pelas más notícias e pelos ataques à cidadania e dignidade dos que vivem à margem do poder político, esfaqueou pelas costas, o tórax do herdeiro do carlismo.

A moça louca, talvez que involuntariamente, feriu o poder. O poder que fez do Nordeste cidadela do crime político organizado, que enriqueceu muita gente industrializando a seca e as enchentes e encravou nessa região bolsões de miséria haitianos e epidemias sudanesas.

O povo nordestino, na maioria das vezes, não conseguiu o respeito dos líderes políticos que escolheu e a moça louca, involuntariamente ou não, por falência cívica ou desequilíbrio emocional, representa muitas dores: a fúria dos latifúndios, das grandes empresas agropecuárias construindo a diáspora violenta do êxodo rural; a pistolagem em conluio com a Polícia Militar matando lavradores e liquidando suas lideranças; a submissão pela taca e pelo ferro em brasa da mulher nordestina; a vitória do analfabetismo e a fulminação da infância empobrecida; a produção de prostíbulos como guetos salariais de sobrevivência e incontáveis fábricas de marginais produzindo bandidos 24 horas por dia nas periferias das grandes cidades. De fato, ela golpeou uma classe política que esfaqueou, por exemplo, até deixar sem sangue, organismos como a SUDENE a SUDAM.

Sem entender talvez, esfaqueou os microorganismos invasores de corpos que editam os mensalões da vida, os vírus da insensibilidade inoculados nos sanguessugas e o vampirismo de políticos que aprenderam a se alimentar do sangue cansado dos trabalhadores.

Em sua mente conturbada, uma última notícia: um salário de R4 24.500 que em pessoas como ela deve desafiar qualquer lógica da compreensão humana.

No tórax de ACM Neto - pois nos tórax se encontram os corações - ela esfaqueou a história. Uma história injusta de fome, de solidão e servidão humana, de desempregos e tristezas compradas nas quitandas onde facínoras da gestão pública ergueram mansões babilônicas e riquezas galáticas.

Imprudente, inocente, inadvertidamente, a moça louca golpeou os mega-salários do Poder Judiciário, os tetos e sub-tetos dos semi-deuses e a falta de teto dos que de fato produzem neste país; golpeou os ganhos de 100 mil reais dos deputados (que sabemos que são muito mais) e, querendo ou não, revelou o nível de desilusão dos brasileiros com as elites que governam e sacaneiam este país; golpeou também a pulsilanimidade dos senhores presidentes da Câmara, Aldo Rebelo, e do Senado, Renan Calheiros.

Em outro front, mas agora intencionalmente, um aposentado se acorrentou à porta da Câmara e foi enquadrado em sabe-se lá quantos artigos do Código Penal, o que não aconteceu com mensaleiros e sanguessugas.

Um erro, por razões óbvias, foi a facada, mas ela penetrou o tórax do Poder. Quem sabe à procura de um coração solidário entre as autoridades que governam este Brasil.

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