Os moradores de Lassance, cidade de 6.500 habitantes localizada no Norte de Minas, a 280 quilômetros de Belo Horizonte, não precisam se preocupar caso necessitem enfaixar alguma parte do corpo devido a fraturas e torções. É que a administração passada comprou ataduras de gesso que dariam para atender toda a demanda da população pelas próximas seis décadas. A quantidade também é suficiente para engessar de uma vez quase a metade de toda a população residente na área urbana, que só conta com um centro de saúde, onde não existe nem mesmo aparelho de raios X para detectar fraturas. Apesar de o município utilizar em média duas ataduras de gesso por mês, de uma só vez a administração passada comprou 1.600 unidades, quantidade necessária para 800 meses ou 66 anos. O pior dessa compra exagerada é que a maior parte desse material só existe na nota fiscal, paga ao fornecedor quatro dias depois das eleições municipais do ano passado.
Além dessa compra, o ex-prefeito Cristovão Colombo Vita Filho (PSDB), conhecido como Tovinho, também adquiriu 50 mil abaixadores de língua (palitinhos de madeira usados para examinar a garganta do paciente), quantidade que daria para as próximas duas décadas. Mesmo tendo atualmente dois médicos – ano passado era apenas um –, foram comprados 25 estetoscópios, que também não foram encontrados em estoque pela administração atual. As estimativas sobre o tempo de consumo desses produtos foram feitas pela Secretaria Municipal de Saúde de Lassance com base na demanda mensal do único centro e atendimento à população que existe na cidade.
Quem vendeu esses e outros produtos para a prefeitura foi a Distribuidora Santa Mônica, registrada em nome de Almindo Gomes da Silva (DEM), candidato derrotado a vereador em Santana do Riacho (Região Central), nas eleições do ano passado. De junho a novembro do ano passado, a Distribuidora Santa Mônica recebeu dos cofres do município R$ 894 mil, valor que corresponde a cerca de 64,7% do orçamento anual da cidade para investimento na saúde, segundo informou a secretária municipal de Saúde, Solange Costa Lucena. “Apesar da quantidade exagerada das notas fiscais, quase nada foi encontrado em nosso estoque”, afirmou Solange, que trabalha há 10 anos como enfermeira na cidade.
Na Receita Federal a empresa de Almindo está registrada como fornecedora de material de escritório e papelaria. Ela deveria funcionar no Bairro Santa Mônica, Zona Norte da capital mineira, mas no local as portas estão fechadas e não há nenhuma placa indicando que ali existe ou já existiu uma papelaria, muito menos uma distribuidora de produtos médico-hospitalares. Essa empresa já é investigada por fornecimento para outros municípios mineiros. Almindo não foi localizado para falar sobre a venda. O contato da empresa obtido pela reportagem é na verdade o telefone de uma residência, também no Bairro Santa Mônica, que anota recados para ele.
Operação 40
As denúncias sobre as compras exageradas e inexistentes feitas durante a gestão do ex-prefeito são investigadas pelo promotor da comarca de Várzea da Palma, Felipe Campos Lucena. Ele disse que já solicitou cópia de toda a documentação para a atual administração, incluindo cópia de todo o procedimento licitatório e das notas de empenho e fiscais. O levantamento está sendo feito pelo atual prefeito. Idison Fernandes (PSDB), que não foi localizado pela reportagem para falar sobre as denúncias. De acordo com informações da prefeitura, ele estava em viagem para Curvelo. O ex-prefeito, que ano passado foi denunciado pela Operação 40, realizada pelo Ministério Público para desbaratar um esquema de fraude para compra de medicamentos, também não foi localizado na cidade.
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